Maria Ávila é escritora, autora de “poemas paridos” e estudante de Serviço Social na UFBA.

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
A cada início de semana costumo anotar os compromissos dos próximos dias, os prazos de entrega, datas importantes… Como desenvolvo dois projetos semanais (o Projeto LIVE MULHERES e o desafio de escrita #desafiomariamaria), os meus outros Projetos estão sempre convivendo com eles. Organizo o meu trabalho de acordo com a data de publicação de cada Projeto, gosto mais de finalizar uma demanda e partir para a outra, fazer muitas coisas ao mesmo tempo me deixa perdida, então separo um tempinho pra cada coisa.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Gosto de planejar, fazer anotações, organizar as etapas do Projeto, mas a minha criação é muito livre e eu sou aberta ao inesperado, então organizo o pontapé inicial, mas todo o resto vai fluindo, isso quando o Projeto não acontece de uma forma espontânea, como o Projeto LIVE MULHERES. Antes de ser como hoje, eu apenas fiz uma Live com uma amiga para falar sobre Frida Kahlo, não imaginava a proporção que iria tomar nem que se tornaria de fato algo organizado e regular. E, sem dúvidas, escrever a última frase é muito mais difícil! Colocar um ponto final, encerrar a viagem, sair do transe que acontece ao longo da criação do texto… Isso exige mais de mim do que iniciar a escrita. Eu acredito com muita convicção que a escrita surge de um processo muito longo, há sempre um acúmulo de vivências, inspirações, sentimentos, pesquisas dentro de quem escreve, no momento de colocar no papel aquilo vai surgindo letra após letra… É assim que eu costumo lidar também com os meus bloqueios criativos: começando! Coloco alguma frase aleatória no papel e deixo que as ideias corram livres, fluam como o sangue nas veias, permitindo a vida em conjunto com um todo maior que, às vezes, a gente nem se dá conta. Em alguns textos, escrevo e me distancio, procuro apenas depois para ler e só então considero pronto ou coloco a última frase, essa sempre demora a nascer.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Até agora tenho a experiência do meu primeiro livro, “poemas paridos”. Eu já desejava há um tempo escrever um livro de poesia, sonhava com isso, mas ainda não tinha uma ideia pronta, algo que representasse o que eu desejava colocar no mundo, então um dia me veio o título, tudo fluiu de uma forma muito orgânica: tive a ideia, gostei, anotei e comecei a trabalhar em cima dos poemas que iriam compor o livro. Criei uma pasta no celular e, sempre que surgia uma inspiração para o livro, eu anotava. Como não imaginava publicar em breve, acabei incorporando a escrita do livro na minha rotina sem muita cerimônia, o que me surpreendeu bastante! No início, eu imaginava que seria necessário um dia X com ambiente Y e estado de espírito Z, mas comecei a escrever e, quando vi, a pasta estava com noventa anotações, entre poemas, frases, ideias… Então decidi publicar e, para organizar tudo aquilo precisei de silêncio, não só o externo, mas principalmente o do lado de dentro. Estar a um passo do que eu considerava tão precioso me assustava, parecia não estar suficiente, mas, aos poucos, aprendi a lidar com isso, comecei a pensar só no resultado, na capa vermelha e naqueles poemas que precisavam tanto sair de mim e voar até outros corações tão ansiosos, inseguros e corajosos quanto o meu. Apenas na penúltima prova do livro eu senti que estava pronto, e foi uma das melhores sensações que já passearam no meu corpo. Não existe condição, nem escritora, perfeita para um livro surgir, o que existe é trabalho, insistência, um medo bem grande e uma alegria maior ainda.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travada?
A minha técnica de sobrevivência é a pausa, jogar tudo para cima nem que seja por cinco minutos. Costumo me concentrar muito em tudo o que faço, e às vezes esse hábito me consome, me deixa exausta física e mentalmente, por isso, para conseguir voltar a mim, preciso me distanciar do que estou fazendo e voltar a minha atenção para algo que me deixe em paz, como fazer as unhas por exemplo, ou comer um acarajé delicioso ou tomar um banho de mar, qualquer coisa que me renove para voltar àquela tarefa. Geralmente, a trava vem do excesso de tensão, então procuro ficar mais leve.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
Certa vez fui convidada para escrever sobre uma mulher cuja postura política foi muito diferente da minha, isso me desafiou a, por um lado, filtrar o que eu admirava nela e observar sua obra por um outro viés e, por outro, me distanciar em um texto poético como eu me distancio em textos acadêmicos. Aquela foi a primeira vez em que escrevi pela ótica da poesia com a ajuda da escrita acadêmica, achei que isso nunca aconteceria. Falar sobre alguém para uma homenagem requer uma admiração muito genuína, e eu não corromperia o meu texto nem o colocaria de forma fria, por isso escolhi fazer um recorte, mas até chegar a esse equilíbrio passei horas debruçada sobre a história dela, sua obra e o que eu pensava sobre aquilo tudo. Essa experiência me ensinou muito sobre flexibilidade, sobre rejeitar o cancelamento e usar aquele espaço para falar sobre a artista, não a mulher. Porém, nunca deixarei de me perguntar se essas esferas são mesmo separáveis. Sinto ter feito o necessário para a situação, o melhor que pude, mas, o texto número um no meu coração é o poema “Fale!”, me sinto orgulhosa por cada palavra colocada nele, como não poderia ser diferente ele está no meu livro “poemas paridos”.
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém uma leitora ideal em mente enquanto escreve?
Os temas surgem com a poesia, e o lugar exato em que a poesia surge é sempre inalcançável. Quando o livro é publicado, ele não me pertence mais, ele é de quem o abrir, e eu sou muito tranquila em relação a isso, escrevo a partir de mim, do que vejo, e sobretudo, daquilo que sinto de forma visceral. A leitora ideal é aquela que será afetada pelas minhas palavras, de um jeito bom ou ruim. Escrever poesia é saber que o verso é sempre maior do que eu, ele abraçará a minha leitora e o meu leitor de uma forma que só a subjetividade dela e dele dará conta.
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Compartilho os meus textos apenas quando sinto que eles estão prontos ou quase prontos, não gosto de mostrar os rascunhos iniciais e costumo confiar apenas na minha mãe para ler os textos “recém-nascidos”.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Quando decidi me dedicar à escrita eu não conhecia tanto a minha própria escrita, foi um passo muito importante para mergulhar em mim e saber mais sobre o mundo literário. Sinto que tenho muito a descobrir e que, naquele começo de tudo, o apoio que recebi foi suficiente e precioso, agradeço a cada pessoa que me acompanha desde então, mas sei que aquilo que eu precisava ouvir só eu, hoje, poderia dizer, e é uma maravilha isso ser impossível, pois cada etapa foi importante, cada aprendizado, conquista e frustração me fez ser quem sou hoje, e eu não abro mão de nenhum detalhe dessa experiência.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Alguma autora influenciou você mais do que outras?
Me encontrar na minha escrita foi um processo desafiador, mas muito gostoso, por um tempo eu escrevia de maneiras diferentes, sobre temas muito diversos. Depois, não sentia muito como era de fato a minha escrita, mas com o tempo fui descobrindo, percebendo como eu gostava de me expressar e comecei a perceber a minha voz dentro do texto. Sem dúvidas, minhas maiores inspirações são, de maneiras diferentes, Clarice Lispector, rupi kaur e Ryane Leão.
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
“poemas paridos”, o meu primeiro livro de poesia, um mergulho na intensidade da palavra, no íntimo do sentir. Um livro escrito com intensidade e entrega, com a força e o amor necessários para gerar uma vida. A poesia presente nele fala sobre ser mulher, ansiedade, dor e libertação. Cada letra é uma lágrima transformada em arte, cada página um respiro poético que acolhe a sensibilidade e a faz um portal para a cura.