Márcio Menezes é escritor.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Não tenho uma rotina específica, mas dedico 5 horas por dia a leitura e a escrita – muito café, obviamente. Posso ler durante 5 horas ou escrever durante 5 horas, ou essas 5 horas se dividem para um pouco de cada atividade. Gosto de ler e escrever em casa ou pelos cafés aqui perto, ou seja, pelos cafés de Botafogo ou do Humaitá.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto pela manhã – como Clarice Lispector- a cabeça ainda tá fresca, aberta ao dia; não sou de escrever à noite, geralmente posso ler antes de dormir ou ver um filme, mas à noite sinto meu corpo mais cansado, é mais provável ir para o bar do que escrever.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Meus dois romances escrevi ao longo de 3 ou 4 horas diárias ao longo de 4 meses ou mais. Mas quando não tenho uma novela para escrever não tenho toda essa disciplina até porque é a estória que te chama, te convida, para conta-la. Quando tenho o romance na cabeça acabo criando essa rotina e acho muito pertinente se isolar ou viajar para um lugar tranquilo para terminar um romance, acredito nisso. Sou de ciclos, não escrevo exatamente todos os dias.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Adoro pesquisa e ela vem logo depois de um melhor detalhamento meu sobre os perfis do personagem; meu próximo protagonista vai experimentar heroína então lá fui eu saber mais sobre a papoula, opiáceos e todos os tipos de efeito. Depois que eu sei – não completamente – sobre enredo e estória, vem a pesquisa e depois o ato da escrita. Acho a pesquisa muito estimulante, abre muitas portas e através dela pode-se até mudar o enredo ou a trajetória de um personagem. Mas cuidado porque o “excesso de pesquisa” pode fazer que você incluía no romance certos conteúdos que só podem interessar a você e não ao leitor e não contribui em nada pra estória, ou pra enriquecer determinados traços de um personagem.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu gosto de projetos longos, mas como todo escritor estou a um passo da euforia e um passo da depressão quando se trata da criação de um texto de ficção. Posso achar incrível determinado trecho feito por mim num momento e depois achar tudo uma merda no segundo depois…como eu lido com a treva da escrita? Bom, com algumas Heinekens, uma volta na Lagoa… qualquer coisa que não me faça pensar muito no motivo do bloqueio…
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Depois do primeiro tratamento pronto e todo o “primeiro tratamento de um texto é uma merda”, já dizia Hemingway, eu contrato um revisor pra fazer as correções ortográficas, depois eu mostro para 3 ou 4 pessoas de confiança. A ´partir do que essas pessoas me passam, faço um segundo tratamento e fico mais seguro em relação a texto e mostro para outras pessoas. A partir daí eu posso tanto enviar para editora ou fazer últimos acertos, depende da obra, do momento… não foge muito dessa dinâmica.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sempre no computador, ou no celular, mas até a década de 90 escrevia com uma máquina de escrever ou em guardanapos mesmo.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Leio muito, desde criança. Acho que o hábito de ler é inseparável do hábito da escrita e quanto mais você ler mas ideias terá… sou compulsivo com livros, filmes, música…essa semana mesmo, enquanto respondo essas perguntas e hoje é quarta, já revi “A dama de Shangai” do Orson Welles, “Cabra marcado para morrer” e devo ver mais tarde alguma coisa do Nelson Pereira dos Santos ou alguma coisa de Star Trek. O que eu vejo, leio e ouço é fonte de inspiração constante…
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Usar menos meta linguagem, falar menos de livros nos meus livros, falar menos de mim mesmo, essa coisa que a gente chama de auto ficção e que hoje em dia tá fora de moda…gostaria de escrever mais em terceira pessoa. Também gostaria de ser mais conciso, dizer mais com menos…
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Estou terminando meu terceiro romance, esse é o meu único projeto no momento…quanto a leitura terminei esse ano “Moby Dick”, do Melville, uma obra realmente maior… um dos maiores romances de todos os tempos…eu adoraria reler toda a obra do Dostoievski, taí um projeto maravilhoso que ainda não consegui… bom, que livro que eu gostaria de ler e que não existe? Tudo já foi dito, não há nada de novo para ser escrito ou lido…