Livia Brazil é escritora, autora de “Queria tanto” e “Coisas não ditas”.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Tenho uma mini rotina, bem mini. Eu sou do tipo que acorda morrendo de fome. Então depois de checar redes sociais, ir no banheiro e falar com os gatos, coloco café pra fazer, pão pra esquentar e depois me sento com minha caneca de café com leite e meu pãozinho na frente do computador pra ver uma série de comédia. Tem que ser comédia pra começar o dia bem e rindo. Quanto mais leve, melhor. Depois de um episódio (às vezes, dois), dou mais uma checada em redes sociais (às vezes me perco por lá e fico umas boas duas horas), e só depois começo de fato o dia. Como trabalho de casa, é bem tranquilo. Mas o dia nunca começa já escrevendo.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Não tenho ritual de preparação pra escrita, mas tenho que sentir que minha cabeça tá no clima. Tem vezes que eu sei que minha mente tá longe, que não vai adiantar eu sentar na frente do computador porque nada vai sair. Mas, infelizmente, o horário que consigo escrever melhor é de madrugada. Digo infelizmente porque sou uma taurina típica e adoro dormir, então às vezes tô lá, deitada, pronta pra dormir, e o bichinho da escrita pica e eu tenho que levantar pra escrever. Com certeza a noite e a madrugada são os horários que eu rendo mais e que meu cérebro está mais desperto e criativo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Eu sou completamente desorganizada e sem rotina. Tenho tentado me organizar mais, mas é um processo. Eu tento escrever todo dia, mas é bem raro. No máximo, consigo escrever um texto curto pra colocar no Instagram, o que tenho tentado fazer todo dia desde julho de 2021, porém nem sempre acontece. Percebi que escrever esses textos curtos para as redes sociais todos os dias destrava algumas amarras que volta e meia (pra não dizer sempre) aparecem, e às vezes esses textos acabam entrando no romance que estou escrevendo no momento.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Meu processo de escrita é uma loucura. Eu sou muito ansiosa e muito crítica comigo mesma, então demoro a começar a escrever porque fico com medo de não ficar bom, então travo previamente já. Mas quando começo, tento, ao menos, escrever uma página inteira por dia. Quando está fluindo, me forço a escrever duas, e por aí vai. Sobre pesquisa, eu prefiro pesquisar quando encontro necessidade, então geralmente é no meio do romance, quando me deparo com algo que não sei. Prefiro fazer assim porque se eu for fazer toda a pesquisa antes, eu não vou começar nunca, porque nunca vou achar que sei o suficiente. Rs.
Mas quando estou escrevendo textos mais curtos, como contos ou crônicas, é bem mais fluido e geralmente escrevo em uma tacada só, e depois reviso, faço as mudanças necessárias etc.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu surto. Hahahaaha Um exemplo disso é que eu estou escrevendo um romance há três anos e ainda estou no começo porque eu sempre acho que está ruim e começo tudo de novo. Como eu disse, sou muito ansiosa e crítica, então é bem complicado lidar com a minha própria cobrança. Mas já foi pior. Hoje em dia estou participando de um grupo de estudos literários onde encontro muito apoio, então nesses momentos de desespero, me apoio nelas (são todas escritoras incríveis). Também falo com uma amiga que é praticamente uma irmã e com minha prima, peço para lerem o que escrevi, para me darem um feedback sincero. Eu preciso de feedback a medida que estou escrevendo, senão não consigo continuar. E elas sempre me acalmam também. E, claro, muita terapia. Mas acredito que ter um círculo de amigos escritores, que entendem o que você está passando, ajuda muito a dar aquele empurrãozinho e incentivo pra você continuar.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Tenho revisado muitas vezes e percebi que não está dando certo, porque acabo mudando tudo. Antigamente eu só revisava na hora de enviar para uma editora mesmo. Era melhor. Talvez eu volte a fazer isso. Mas hoje em dia eu sinto que preciso revisar tudo para continuar para o próximo capítulo.
Como eu disse antes, eu tento mostrar para muitas pessoas antes de publicar, posto em redes sociais para ver como é a recepção também (não os romances). Preciso desse feedback pra ter segurança de seguir em frente. Com o romance que estou trabalhando no momento, enviei para uma profissional que fez leitura crítica, o que foi ótimo e me deu várias novas ideias.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tenho escrito no computador por pura preguiça de depois ter que digitar tudo, mas fluo muito melhor com papel e caneta. Talvez por terem sido tantos anos escrevendo assim, meu corpo se acostumou e se sente mais confortável escrevendo no papel. Mas é boa a escrita também no papel porque, quando vou passar pro computador, acabo mudando muita coisa e melhorando o texto. Por isso prefiro escrever no papel. Mas tenho escrito mais no computador mesmo.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Acredito que minhas ideias venham da vontade de contar histórias de mulheres que não se encaixem em padrões e não são muito bem aceitas na sociedade. Daí quero escrever histórias que deem espaço para essas mulheres, já que a sociedade não dá.
Antigamente, quando a gente podia sair, eu tirava ideias de coisas que eu via no meu dia a dia, uma cena no caminho até o trabalho, uma conversa no ônibus. Uma conversa com um amigo pode inspirar também. E filmes. Filmes sempre me inspiraram muito, porque sou apaixonada por Cinema. E, obviamente, ler muito. De tudo, todo tipo de literatura. De clássicos a fanfics.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Mudou taaaanto! Eu tinha muita facilidade pra escrever, as ideias vinham aos montes e às vezes eu tinha que torcer pra parar de ter ideias e inspiração. Hoje em dia é um sacrifício. Acredito que de uns dez anos para cá a escrita se tornou difícil pra mim. Não sai com fluidez, é preciso muito esforço. E nem estou falando de contar com a inspiração, algo que muito escritor iniciante (e comigo também aconteceu) fica esperando. Mesmo com as ideias, está difícil passa-la para o papel. É preciso muita dedicação, muito esforço, muito estudo, mais do que antes. Talvez porque estou cada vez mais crítica comigo mesma, não sei. Mas muitas vezes gostaria de voltar a como era antes. Quase sempre.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria de escrever um musical, mas isso não está no campo da Literatura, né? Hahahahaha Eu tenho vários romances inacabados, pelo menos três, e pretendo finalizar todos eles e publicá-los. Gostaria de participar de alguma antologia também, principalmente com outras escritoras mulheres. E gostaria de fazer algo com minhas amigas escritoras. Tenho cada vez mais achado que a resposta está no coletivo, em fazer coisas em conjunto, e quero muito ter essa oportunidade. Sobre o livro que eu gostaria de ler e ainda não existe, gostaria de ler o livro de todos amigos escritores que ainda não publicaram. O que mais amo é ler livros de amigos, e quero que todos os meus tenham a oportunidade de publicar um algum dia, porque a sensação de ter um livro seu publicado é uma delícia!