Lisa Alves é escritora e artista, autora de “Arame Farpado” (2015).

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Depende de muitos fatores como prazos, por exemplo. E eu não funciono com muitos projetos literários, pois tenho outras atividades como leituras, estudos, pesquisas e meu trabalho que já me toma muito tempo de vida.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Nem sempre planejo, mas gosto de colocar prazos, funciono melhor assim.
Uma vez li que a última palavra já foi esquecida e a primeira ainda ecoa no universo. Acho o início e o final de um texto sempre difícil e complicado. Você pode matar seu livro com a primeira frase e destruir todo um trabalho com o final. Mas como leitora sei que o início de um poema ou de um livro é que me marca mais, então prefiro seguir o faro da leitora e transferir para a escritora.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Eu gosto de música instrumental para escrever. Tenho a minha playlist para isso. Também não dispenso um café. E se o ambiente não está silencioso, uso fones de ouvido.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travada?
Eu tenho uma lista de livros para ler durante a vida e quando estou travada para escrever, lembro dessa lista que irá me exigir mais de uma vida para ser lida.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
Meu próximo livro “Jardim de Pragas” foi o que me deu mais trabalho e é o que mais me orgulho. É um livro que me exigiu muito, incluindo vidas e mortes (reais e simbólicas).
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém uma leitora ideal em mente enquanto escreve?
Não tenho uma metodologia para escolher os temas. Só sei que estou sempre aberta para o óbvio e para o mistério.
Sim. A leitora existe antes da escritora e se eu perder a leitora é porque eu perdi a paixão pelos livros e para mim não faz sentindo escrever sem paixão.
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Quando estou pelo menos cinquenta por cento satisfeita com o que escrevi e quero ou preciso de uma opinião profissional ou de quem tem a mesma paixão que eu tenho pela leitura. Geralmente as primeiras pessoas são colegas de escrita que confio muito e sei que não me deixarão publicar algo só por publicar.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Comecei a escrever na adolescência, não para publicar, mas por uma necessidade de criar algo fora daquela realidade. É interessante, pois é uma das poucas coisas que não mudaram nos últimos trinta anos. Então posso chamar de dedicação.
Na época, tudo o que ouvia sobre ser escritora estava completamente fora da minha realidade. Não tinha escritores na minha família e raros leitores.
O que eu gostaria de ter ouvido e não ouvi? É que se Carolina Maria de Jesus esperasse ter uma vida confortável ou um teto só dela, não teríamos lido e escutado “Quarto de despejo”, nem Casa de Alvenaria, nem Pedaços de Fome, e nem qualquer livro póstumo dela. Muitas vezes é no front da vida que nasce as criações mais exuberantes e profundas. E não leiam isso como romantização da miséria. A questão é: se a gente esperar virar elite para escrever, nossa escrita será sempre mais do mesmo e falaremos sempre da mesma roda que roda que roda em uma única narrativa.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Alguma autora influenciou você mais do que outras?
Eu ainda estou em processo de mutação.
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
A mulher submersa da Mar Becker.
* Entrevista publicada em 10 de julho de 2022.