Letícia Cordeiro é escritora, autora de “A verdade sobre você” (2020).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
O dia perfeito começa com uma meditação. Não costumo escrever pela manhã. Nesse primeiro momento, tento apenas organizar e manter meus pensamentos calmos, como se fossem água parada. Claro que vez ou outra, durante minhas reflexões, versos podem surgir. Por isso, deixo sempre um caderno e uma caneta ao meu lado. Alguns poemas são insubstituíveis e precisam ser anotados na hora para não serem esquecidos.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sem dúvida, prefiro escrever à noite. Trabalho durante o dia como professora, então o período noturno é o que tenho menos preocupações. É como se todas as inspirações do dia tivessem acumulado nesse horário. Às vezes, sento na minha mesa de trabalho e cada palavra flui naturalmente e faz sentido existir. Outras vezes, não existe sentido para a vida se não dormir. Sobre os rituais, talvez o único que faça sentido para mim é escutar as músicas da Lana Del Rey enquanto escrevo. Sinto que ela me entrega suas próprias histórias quando eu não tenho as minhas.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Tento escrever um pouco todos os dias, pra não perder o hábito. Mas deixei de lado o perfeccionismo que existia em mim.
Não estipulei nenhuma meta de escrita. Já fui muito organizada em relação a isso, estabelecia dias e horários. O resultado é que eu passei a odiar cada verso que escrevia e, consequentemente, a mim mesma. Comecei a deixar fluir e a me cobrar menos.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
É sempre difícil começar qualquer coisa quando não se está inspirado. Por isso, sinto que produzo muito mais quando estou feliz comigo. Tento cuidar mais de mim, primeiramente. Pratico yoga e sou adepta da terapia. Esses hábitos melhoraram consideravelmente minha escrita. Minha pesquisa depende do quanto me entendo comigo, já que meus poemas e crônicas geralmente são autobiográficos.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
É muito mais fácil lidar com as travas de escrita quando tenho um prazo a cumprir. Exemplo: Vou participar de uma antologia e preciso enviar o texto até quinta. Na quarta-feira estarei trabalhando intensamente em uma obra prima (risos). O medo de não corresponder às expectativas é algo inerente ao ser humano. O único diferencial é o que você faz em relação a isso. Escrevo pra superar. Projetos longos, se apaixonantes, costumam dar mais energia a cada passo que dou.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Uma ou duas vezes. Tenho um bom motivo para isso: Quanto mais reviso, mais acho que está ruim. Aí eu não envio (Risos). Sempre fui exigente demais em relação a minha escrita. Estou trabalhando nisso. Na maioria das vezes que achei que não estava bom o suficiente, era muito mais do que o suficiente para o meu propósito. Às vezes, quando estou muito em dúvida, mostro para algum amigo ou amiga. Pergunto como essa pessoa se sentiu em relação ao que escrevi. Se ela se emocionou, atingi minhas expectativas.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Prefiro escrever à mão. Sinto que tenho mais espaço para as minhas ideias fluírem e a simplicidade de riscar quando não gosto de algo que escrevo me conforta. Quando não tenho um caderno por perto, escrevo no celular mesmo, em um aplicativo chamado Evernote.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Do amor. Quanto mais me permito viver (e me envolver) emocionalmente, mais escrevo. Percebo que fico mais criativa quando me cerco de mais pessoas como eu. Agora nessa pandemia, tenho me permitido conhecer mais pessoas online e participar de sarais. Depois deles, me sinto mais motivada a escrever.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Quando comecei a escrever, achava que deveria estabelecer uma meta absurda de escritos por dia. Costumava esquecer que era humana. Alguns dias simplesmente não é possível ter metas. Pessoas estão adoecendo. Não só por causa do Covid-19, mas por exigências com elas mesmas, que vão matando-as aos poucos. Se pudesse voltar no tempo, com certeza diria para ser fiel à minha essência e acreditar mais na minha capacidade.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
No momento, estou trabalhando em uma série de poemas sobre ansiedade. Também gostaria de criar um podcast para divulgar artistas independentes. Ainda estou planejando de que forma isso será feito.