Laura Conti é poeta multiartista.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Com yoga. Sem pegar no celular, e em jejum. Nem sempre consigo honrar, mas esse é o meu começo ideal. Na quinta, ao invés de yoga é pilates. De toda forma, meus inícios de dia são movimentando meu corpo, inclusive poque conduzo outros corpos logo em seguida. Minhas manhãs também se ocupam das aulas que ministro de dança e ballet para crianças. Fora isso, também sou atendida em psicoterapia e cumpro meus estágios de psicologia pela manhã. Procuro escrever as famosas “Morning Pages”, tenho conseguido e gostado de inclui-las nas manhãs. Tem uma música brasileira que diz “quando a gente ama tudo é manhã”, concordo. Fico irritada se acordo tarde e perco a vida inteira que mora na manhã.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto do fim da tarde para a noite. A hora do mistério, as cores do céu que entardece. Meu ritual é simples, preciso do espaço organizado e limpo, então começo assim, e percebo que este movimento de limpeza e organização também vai acontecendo pra dentro. Preciso de música sempre e incenso quase sempre.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Um pouco todos os dias. Até quando não escrevo. As vezes não dá tempo de materializar a escrita, mas ela se inscreve sem licença na gente né, então sim, escrevo todo dia. Também tem que este é o 5º ano que tenho noitários, tenho usado da mandala lunar, toda noite registro alí o que tiver. As vezes é uma escrita relatório, do que houve, as vezes é uma escrita que planeja, do que vem, as vezes é sonho, angustia, é um espaço seguro e muito meu pra descansar na escrita. Não tenho nenhuma meta, admiro quem as traça e quem as segue, não do conta de nenhum, e também não pretendo, ao menos por agora.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
O movimento é imposto. Escrevo muito do espontâneo, do que me convoca. Na faculdade, uso o caderno pra escrever o que vaza e que não da pra ficar comentando o tempo todo, uso muito blocos de notas, escrevo o que vejo, o que falta, o que me escuto dizendo pra mim. Agora, as escritas de encomenda, sobre um tema especifico, para uma data, um público, me fazem buscar alimento, desde comidas, cheiros, vídeos, músicas, textos, me fazem ficar olhando pro teto e deixando que vá me invadindo até vazar, é um pouco romântico dizer assim, mas é o que tem acontecido, aliás, estas escritas de encomenda tem pouco tempo de revisão e edição porque a urgência é que me faz fazer, rs. Não recomendo, mas já conheço essa minha dinâmica, na ultima hora o que tiver que sair, sai! Eai é a coragem de ir com o que tem.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Lido fingindo. Fingindo descanso, aquele descanso culpado porque sabe que queria estar cumprindo com as expectativas de produzir, de escrever. É difícil, descansar descansando ao invés de descansar distraindo. Com o medo, insegurança, vergonha e todos os etc eu lido no corpo, yoga, pilates, técnica de matha graham, cheia de saudade de uma pista de dança, um forró. Acho que meu modo é de lidar é não lidando, é a espera do decantar. Assumir o que sinto, engolir e deixar a digestão durar.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Depende. Primeiro que acho muito difícil o trabalho de autoedição, ou porque ficamos apegadas demais ao que escrevemos ou somos criticas demais, é um regime de extremos. Agora, o que eu faço é revisar pouco, talvez porque ainda não tenha aprendido e me comprometido com essa parte como se deve, e porque tenho sido reforçada positivamente ao publicar o que pouco reviso. Ainda que tenha me encantado “Profissão de fé” do Olavo Bilac no ensino médio, sou mais das pedras brutas – inclusive essa entrevista, num será revisada rs. E, também não é sempre que compartilho com outras pessoas antes de publicar, são raras as vezes na verdade, quando mostro são pra amizades intimas e que acompanham meu caminho na escrita.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Ambígua. Gosto das pontes e dos imediatos de publicação que o virtual oferece ao mesmo tempo que me cansa o visual e sinto falta dos outros sentidos, de fazer o que escrevo público através de materialidades além do ver e da descartabilidade das redes sociais. Sobre a escrita, acontecem quase todas a mão, no papel, quando não disponível recorro as notas do celular e pra digitar no computador são raras as vezes, geralmente quando preciso de uma dinâmica rápida de registro que sei que o manual não vai acompanhar, mas acabam que não são minhas escritas favoritas também. Inclusive, no meu primeiro conto publicado que está no livro “Carolinas” conto dessa relação como papel.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Do cotidiano. Eu acho que fazer arte é compartilhar a própria percepção do que tem ou do que falta na vida, e é um exercício possível e fértil treinar as percepções, escolher um objeto e que está a sua frente e tentar fazer poesia, metáforas, inventar, por exemplo. Inventar, é uma palavra que me ocupa, porque tem vento dentro, a própria língua e seus-meus limites me dão muitas ideais. Meu cotidiano é muito diverso, tem crianças, adultos, brincadeiras, reuniões, organização política, trabalho, dança, faculdade, pesquisa, então cada um destes lugares me faz acessar ideias diferentes que busco confluir na escrita. O hábito para criatividade é o habito do encanto, e pra mim o dos tempos de pausa, esperas, espaços, criar espaço e tempo pra criatividade ocupar.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que perdi a capacidade do simples, poesias curtas que me bastavam as rimas, hoje escrevo muito mais (de quantidade) e em prosas poéticas, parece que preciso de mais palavras, é o que mudou. A coragem pra escrever sobre o que quiser-precisar também chegou, vem chegando. Diria para me encantar mais do que me contentar com os primeiros brotos, pra ser mais acolhedora do que crítica.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
O projeto que gostaria de fazer e ainda não começou é de conduzir processos de escrita através de aulas que convidam o corpo para o movimento. E, também tem um projeto de ocupar as ruas com poesia que gostaria muito de realizar. O livro que ainda não existe, ou não o encontrei fala de um futuro em que nosso principal sentido será o toque, honraremos os mamíferos que somos e lambidas serão o cumprimento típico da espécie, uma intelectualidade a partir do corpo que conversa e convive com corpos diversos, aprenderemos marcar tempo para dança com as árvores.