Larissa Fonseca e Silva é mestranda em Letras, autora de “Contos de Descômodo” (2021).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Gosto que minhas manhãs comecem lentas e, por isso mesmo, prefiro acordar mais cedo. Não tenho uma rotina matinal fixa, mas, como nesse período a rua e a casa estão mais quietas, costumo dedicar tempo a leitura ou a estudos. Tenho experimentado escrever pela manhã também… Especialmente os contos (os gêneros poéticos são melhores ao final do dia). A ideia é que a escrita se torne parte da minha rotina matinal deste ano, e dos próximos.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sinto que pelas manhãs minha concentração é maior, então é um período bom para atividades que exijam isso de mim. Quanto ao ritual: são as primeiras palavras. As primeiras palavras não são necessariamente literárias, mas chamam as outras. O ritual é então, creio, pegar os papeis e começar a rascunhar qualquer pensamento ou ideia. As palavras literárias ficam tentadas com essa movimentação e acabam se aproximando. Aí vêm os contos ou os poemas.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Por muitos anos, escrevi conforme a inspiração, seguindo como meta apenas os prazos que eu estabelecia para atualizar meu blog, por exemplo. Ultimamente, porém, tenho tentado escrever um pouco todos os dias. Descobri que minha escrita de histórias flui muito bem pelas manhãs, como mencionei. Pretendo separar minha meia hora matutina diária para escrever uma página ao menos. Quanto aos poemas, eles têm surgido no meio das folhas noturnas que uso para registrar alguns devaneios aleatórios. Então, também é uma nova meta prosseguir com esses “parágrafos de fim de dia”, dos quais dá para colher alguma arte.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
A escrita dos gêneros poéticos é fácil e natural, especialmente porque eu não sigo nenhum tipo de padrão ou métrica. Meus poemas e prosas poéticas são bem simples. Os contos já exigem um pouco mais de mim… Não costumo empreender pesquisas para escrevê-los, uma vez que parto de uma realidade conhecida. Ou melhor: sinto que indago muito das minhas origens e do meu redor, e isso vai sendo processado aos poucos dentro de mim até que resulte em uma história. Nesse caso, é como se a pesquisa fosse anterior à ideia.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
A escrita é uma parte da minha identidade; não consigo entendê-la como fora dela. Assim, por clichê que soe, escrever é uma comunhão comigo mesma, e que pode, ou não, resultar em algo publicável. Inúmeras vezes não resulta, e o efeito de satisfação é o mesmo. Só fico insatisfeita se, por um descuido ou pressa, eu acabar publicando algo que, no fundo, eu sabia que não estava pronto, ou que não era bom. Ou seja: o problema não são os textos ruins; o problema é quando eu, sabendo que o são, acabo os levando a público.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes. Reviso-os no rascunho, no momento da digitação, depois de digitados… O que não garante quase nada, claro.
Quanto a mostrar a outras pessoas: depende do propósito do texto, e do local em que ele vai circular. Os textos que publico no blog, por exemplo, não costumo mostrar a ninguém antes da publicação, porque não acho necessário. Porque, ainda que o blog seja um espaço de leitura, também é um espaço de rascunho: os textos que estão ali podem ser reeditados facilmente se passar algum erro. Além disso, são dos textos do blog que partem as postagens no Instagram (@resquiciando.me) ou que partiram os contos da minha primeira coletânea, Contos de Descômodo. Essas segundas ou terceiras publicações costumam ser revisadas, mais uma vez. Em resumo: se fôssemos infinitos, o processo de reedição também seria.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
A tecnologia é uma aliada, mas minha principal ferramenta segue sendo o papel. Assim, meus primeiros rascunhos são sempre feitos a mão. O pensamento desliza muito melhor ali, e, como a velocidade da mão é bem mais devagar do que a do pensamento, eu sinto que tenho tempo suficiente para escolher a melhor opção, no momento, para alguma estrutura da narrativa ou do poema. A folha física também me dá maiores noções de onde posso riscar, tirar, acrescentar… Prefiro.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias dos contos vêm dos casos, causos e notícias ao meu redor, que é o interior mineiro. Já as ideias dos poemas vêm de vislumbres que vou conseguindo fisgar durante o dia, culminando em registro à noite. Mas claro que todas essas ideias só adquirem alguma função artística porque consumo muita literatura. As impressões causadas pelos livros que leio são a mediação entre mim e o papel.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Mudou o cuidado que tenho com os textos, que, comparado ao da minha adolescência, por exemplo, é muito maior. Hoje também me conheço melhor, e sei quais trabalhos me deixam feliz por tê-los publicado. Isto é: ainda que nós, escritores, possamos fingir todo tipo de coisa, não é todo tipo de coisa que ficamos satisfeitos por fingir. É a questão dos temas — quais nos seduzem melhor — e do estilo — qual nos traduz com mais eficiência.
Eu diria, apenas, para eu continuar escrevendo, exatamente como fiz. Esse autoconhecimento a que me referi só veio com tentativa e erro. Continua sendo tentativa e erro.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de escrever alguma história maior do que uma novela, que foi o maior gênero literário, em extensão, ao qual consegui me dedicar (ainda assim, não satisfatoriamente) até hoje.
Quanto ao livro que gostaria de ler e que ainda não existe: boa pergunta! Ter uma resposta para ela seria útil até para me ajudar nesse projeto que ainda não comecei… Mas a literatura é tão rica e tão linda que eu sinto, somente, que eu gostaria de ter tempo para ler tudo o que há para ser lido. Como naquele filme, About Time, em que uma das personagens pode voltar no tempo e o faz apenas para ler um pouco mais.