Joselma Noal é escritora, doutora em Letras, professora e tradutora pública juramentada.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Penso que a rotina de todos foi alterada pela pandemia, comigo não foi diferente. Agora, em virtude do trabalho no ensino remoto, costumo despertar às nove horas. O gato me espera na porta do quarto e os primeiros minutos do dia são dedicados a ele. Depois tomo café com calma. Organizo a casa, penso no que farei de almoço e depois, me dedico à escrita.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto de escrever pela manhã no meu escritório. No silêncio ou com as músicas que estão relacionadas ao projeto de escrita do momento. Vejo minhas anotações a mão e no bloco de notas do celular onde, às vezes, registro ideias literárias. Ligo o computador de mesa, abro o arquivo e releio as últimas linhas escritas em voz alta antes de começar a escrever.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Gosto de escrever todas as manhãs. A função do trabalho, de reuniões tem dificultado o cumprir uma meta diária. Tenho sido mais flexível, estabelecendo meta anual, semestral, mensal. Por exemplo, retomei a escrita de um romance em abril de 2020 e estipulei o prazo de término no final do ano. Precisei de mais um tempo e finalizei no início de 2021. Fiquei satisfeita com o trabalho realizado e com o quase cumprir o meu prazo inicial. Não tenho sido tão dura e exigente comigo mesma.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Para a escrita do romance li muito para construir o pano de fundo histórico. Também, entrevistei algumas pessoas e obtive depoimentos valiosos. Pesquisei bastante, até me sentir segura para iniciar a história. Durante a escrita dos capítulos, pesquisei sempre que necessário, e foram muitas vezes e, claro, no momento da revisão. Agora estou num projeto mais intimista e memorialístico, um livro de crônicas dedicado ao meu pai. Demanda menos pesquisa, só o recordar. Estou no momento a sorrir e a chorar no processo da escrita e tendo muito cuidado para não ser piegas que é, na verdade, meu grande medo desde que idealizei o livro. Busco o comover na dose certa. Mas tenho me perguntado se a dose certa existe e não estamos mesmo precisados de um exagero de emoção em tempos tão tristes…
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Sou organizada, disciplinada quando se trata de escrita. Por exemplo de 20 de abril a 6 de novembro de 2020 escrevi minicontos em forma diarística, projeto que denominei: #minisdeaquarentena. Escrevi por 201 dias para brincar com o nome do meu livro que se chama Duzentos e que tem exatos duzentos minicontos. A princípio seria postado, exclusivamente, no Twitter, porém foi sendo ampliado a outras redes: Facebook e Instagram. Depois resolvi organizar o blog. Dois projetos diferentes: miniconto e romance escritos no mesmo período. Sobre o #minisdequarentena a resposta era imediata, tenho um pequeno, mas fiel público leitor, que curtia, compartilhava, comentava. E fiquei muito feliz ao ser lida por estudantes de ensino médio que trabalharam em suas aulas com os minicontos. Participei de Lives sobre o projeto e tive uma resposta linda. Penso que o maior objetivo foi atingido: o de propiciar arte de forma acessível durante o período de quarentena. E assuntos não faltaram, não me permiti o sofrer bloqueio. O dia que estava sem saber o que escrever, selecionava alguma notícia do jornal e brincava transformando-a em miniconto. Com relação à narrativa longa, se algum dia não queria escrever, me dedicava a pesquisar ou a revisar. Quanto à ansiedade, à expectativa sempre há. Só fiquei mais tranquila sobre a qualidade estética do romance, após receber os feedbacks positivos de um grupo seleto de primeiros leitores sinceros e qualificados.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso muitas vezes, sou muito exigente com a linguagem, leio tudo em voz alta e faço muitas alterações até julgar que está bom. Sim, mostro a outros leitores. Considero essencial ter a opinião e o olhar do outro sobre o meu texto. Aliás sou grata as amigas que leram os originais do Aroma Hortelã, meu primeiro livro, publicado pela Editora Movimento, em 2007. Se não fosse pelo empurrão das minhas colegas leitoras, eu jamais teria submetido a nenhuma editora.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrevo direto no computador, mas faço muitas anotações em bloquinhos e também uso o bloco de notas do celular.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias estão todas aí, basta olhar a janela. Eu penso que o escritor deve ser movido à arte e a natureza. Ler, visitar museus virtuais, assistir filmes, séries e peças teatrais, ouvir música, contemplar a natureza, caminhar, formam parte dos meus hábitos.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Amadureci na vida e na escrita. Demorei a me assumir escritora, a dar a importância devida à arte literária na minha vida. Então eu diria para a Joselma, que sempre gostou de escrever, desde menina, que deveria seguir sempre lendo, escrevendo muito e que acreditasse mais em si mesma como escritora.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho tantos livros ainda a escrever e a ler que a pergunta me parece difícil de ser respondida. Tenho um arquivo no computador chamado Ideias Literárias que cada vez cresce mais. Finalizando o livro de crônicas devo escrever outro romance que já está sendo traçado. Gostaria de escrever um livro do qual as pessoas sempre se lembrassem com afeto. Quero ser autora de uma obra capaz de deixar marcas memoráveis nos leitores. E quero seguir lendo livros que existem e emocionam, aliás a minha lista de livros a serem lidos é enorme e está no bloco de notas do meu celular.