Jean-Yves Beziau é doutor em Filosofia e em Matemática, pesquisador do CNPq e professor da UFRJ.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Vendo o nascer do sol no mar, escutando música, bebendo chá (prefiro chá a café, gato a cachorro, Platão a Aristóteles).
O ideal seria, depois da cerimônia do chá, todos os dias, escrever. Já fiz isso, mas fiquei cada vez mais atarefado com trabalhos de direção e organização: fui Presidente da Academia Brasileira da Filosofia, lancei o dia mundial UNESCO da lógica, sou o atual Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Filosofia na UFRJ, editor das revistas Logica Universalis e South American Journal of Logic, de cinco coleções de livros, responsável da área de lógica da Internet Encyclopedia of Philosophy, organizador de quatro séries de congressos internacionais, de um webinar mundial bimensal de lógica…
Todos esses trabalhos são importantes, mas daqui a pouco vou voltar a escrever diariamente de manhã, é bom para a saúde!
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Horários diferentes correspondem a estados psíquicos diferentes, cada um é interessante, tento aproveitar todas essas variações.
Para escrever tem que se concentrar, ficar livre de preocupações, barulhos, e outros distúrbios. Eu escuto música, eu trabalho em função da música.
Os matemáticos geralmente gostam muito de música, James Joseph Sylvester, criador do American Journal o Mathematics, caracterizou essa ciência dizendo: A matemática é a música da razão.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Tento escrever todos os dias, mesmo que seja só por uma hora. Escrevo vários tipos de coisas: artigos de filosofia, lógica, matemática, semiótica, poemas, letras de música, aforismos, contos, verbetes de enciclopédia, textos autobiográficos…
No entanto, o que escrevo mais no momento são artigos de pesquisa de cerca de 15 páginas, o que corresponde ao formato atual do mundo acadêmico.
Em média eu escrevo um artigo de 15 páginas em um mês, trabalhando regularmente todos os dias. Às vezes, eu escrevo simultaneamente dois ou três artigos, trabalhando um pouco sobre cada um, quotidianamente. Acho bom alternar, não trabalhar o dia inteiro sobre a mesma coisa. O Jean-Jacques Rousseau recomendava fazer isso, sigo o conselho dele desde a minha juventude.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Para mim é um processo com três fases. A primeira é a fase de gestação, fico pensando e coloco algumas ideias no papel e/ou na tela do computador, faço palestras, dou aula sobre o assunto, converso com colegas e amigos. A segunda é a fase de construção, é a mais difícil: escrever sentenças completas, articulando e formulando as ideias, até chegar numa primeira versão do artigo. Aí começa a terceira fase que é de refinamento, de polimento, de lustragem, aquela que acho a mais prazerosa. Podemos fazer uma analogia com a escultura.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
O importante é insistir e não se interromper, especialmente na segunda fase, não deixar a construção parada no meio do caminho. Tem que se obrigar a trabalhar regularmente e sistematicamente, mesmo só um pouco, todo dia se possível.
A derradeira vez que trabalhei em projetos longos foi quando era estudante: escrevi dissertações de filosofia, matemática e cinema (as três disciplinas que estudei na universidade). Não tive muito problema a fazer isso. Em todos esses casos, pesquisei e pensei durante um tempo relativamente longo e depois sentei para escrever num tempo curto.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso pelos menos 3 vezes e até 10 vezes. Gosto muito de fazer isso, sou perfeccionista, gosto de trabalhar os detalhes, achar a palavra certa para a coisa certa (the rigth word for the right thing), a melhora formulação, até chegar ao ponto satisfatório, onde tudo é poliment correct!
Depois eu descanso durante pelo menos uma semana. Eu mando o artigo para alguns amigos que me mandam comentários e aí eu retrabalho um pouco o texto, geralmente não muito, mas são ajustes, pequenos retoques, que são as vezes bem valiosos.
O ano passado (2020) escrevi um artigo – The Mystery of the Fifth Logical Notion (O Mistério de Quinta Noção Lógica) – que eu mandei para mais de cem amigos antes de preparar a versão final. Foi uma experiência interessante, os comentários me auxiliaram a bem melhorar a lustragem do artigo, fazendo ele brilhar mais.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Quando era criança aprendi a escrever usando pena (de metal) e tinteiro, não era fácil … Depois escrevi usando canetas. Mas comecei a usar máquina de escrever bem jovem, quando tinha 7 anos (na nossa casa tinha uma máquina da Olympia Werke que me apropriei), eu gostava disso, para mim era o piano do pensamento.
Na universidade eu escrevi minhas dissertações de mestrados usando máquina de escrever. Isso foi um bom exercício, porque esta ferramenta obriga a bem pensar antes de escrever. Depois para doutorados passei para o computador.
Comecei a usar computador para escrita em 1991 (mas já comecei a usar este instrumento cinco anos antes para programação – entre outras coisas, estudei na universidade Teoria da Computação). Gosto porque permite escrever em espiral. Também permite fazer pesquisas ao mesmo tempo que escrever. No momento, estou trabalhando com três telas: uma horizontal na minha frente para escrever o artigo, uma horizontal na esquerda para fazer pesquisa navegando na internet (Navegar é preciso, a vida não é preciso, como escreveu Fernando Pessoa), e uma vertical na direita para ler artigos ou livros. Eu uso também cadernos e folhas de papeis para anotar ideias antes e durante a escrita no computador, em casa ou fora de casa.
O problema do computador é para escrever matemática. Até hoje não há um bom programa para fazer isso. O software LaTeX é uma coisa meio monstruosa, tem que escrever fazendo programação no mesmo tempo, é a mesma coisa que se para dirigir um carro você precisava ser mecânico ou engenheiro. Mesmo que eu estudei ciência da computação, e que então entendo facilmente como funciona, não gosto disso, é muita perda de tempo. O programa Microsoft Word para escrever matemática não tem este defeito, mas é bem limitado, como se a matemática se reduzia a escrever equações, o que não é o caso. Na matemática se usa bastante a bidimensionalidade e também todo tipo de diagramas. Espero que no futuro será possível escrever à mão e que um programa transforma automaticamente isso num documento digital, seria o ideal.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Enquanto criancinha, minhas irmãs (tenho quatro) me contavam muitas histórias. Depois, a partir de 5 anos, comecei a ler bastante, e eu pensava muito, passeando na natureza, com o meu gato Popolasca.
Meu pai trabalhava na administração da floresta e tive sorte de morar em lugares bonitos e inspiradores, em particular na Córsega, conhecida como L’Île de Beauté (A Ilha da Beleza). É de fato um dos lugares mais belo do mundo, com cachoeiras, rios, lagos, montanhas nevadas e o mar … um lugar encantador. Perto da nossa casa, que ficava na entrada da Scala di Santa Regina, tinha cogumelos de tamanho gigantesco, em particular o famoso cogumelo vermelho com pontos brancos, Amanita Muscaria.
A Corséga ficou famosa através do conto Colomba (1840) de Prosper Mérimée, um dos melhores escritores de língua francesa, autor também do conto Carmen, que se tornou famoso através da ópera de Bizet, e de um celebre ditado, um verdadeiro desafio para quem acha que sabe escrever corretamente o Francês (O Imperador Napoleon III fez 75 erros, quem ganhou foi o embaixador da Áustria, o princípio Richard Klemens von Metternich, que fez só três erros apesar do fato que o Francês não era a língua nativa dele).
Morei também nas montanhas perto de Genebra e do Mont Blanc, outro lugar incrível. Nossa casa era do lado do castelo de Francisco de Sales, um famoso santo da igreja católica, autor de Introdução a Vida Devota (1609), o livro mais vendido da igreja católica depois da Bíblia.
Na escola tive uma professora que nos fazia praticar um exercício bem interessante: botava uma música de longa duração, tipo sinfonia, e devíamos escrever uma história. Eu me lembro em particular de ter escrito uma história no ambiente de Quebra-Nozes de Tchaikovsky. Eu tinha muita imaginação. Felizmente até agora nunca me faltou criatividade.
Tive outra professora que nos fazia praticar um exercício mais clássico, a recitação de poemas. A parte criativa era devida ao fato que a professora deixava-nos escolher os poemas que recitávamos. Eu gostava de Jean de La Fontaine e escolhia as fábulas mais longas para desafiar a minha memória (uma tem mais de 500 versos). Tenho boa memória e acredito que isso facilita a escrita, não no sentido de repetir o que já lemos, mas para fazer a síntese de uma grande quantidade de ideias diferentes.
Muitas ideias me vendo conversando com outras pessoas e viajando, em particular participando de congressos e dando aulas, mas também falando informalmente com amigos e amigas.
No Brasil, conversei por dias com o Tarcísio Pequeno passeando no Ceará (Guaramiranga, Praia de Iracema, Canoa Quebrada …). Ele era professor de inteligência artificial da UFC (Universidade Federal do Ceará) e agora é diretor da FUNCAP (Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico). O resultado disso são dois artigos, um sobre regras de jogos, The Rules of the Game (artigo conjunto), outro sobre o acaso, Dice: a hazardous symbol for chance? (artigo para um livro em homenagem a ele).
Mesma coisa com minha namorada Catherine Chantilly, pintora, viajando no mundo inteiro. Isso levou em particular a dois artigos, um sobre a pintura, no ambiente da Ilha de Pascoa, The Hexagon of Paintings (artigo conjunto), outro sobre o riso, no ambiente de Sinaia na Romênia, Risoto et Rosita au Pays du Rire – A Comic Trip for the Few Happy Francophones(como falou Schopenhauer, o riso é a única qualidade divina do ser humano).
Colaborei e continuo colaborando também com meu ex-orientador Newton da Costa, um dos pensadores mais originais e criativos do Brasil, tão bem que organizei em dezembro de 2019 no Rio de Janeiro o primeiro congresso mundial da Academia Brasileira de Filosofiaem homenagem aos 90 anos dele, escolhendo com temática a criatividade. Da Costa foi fundamental no início para me guiar na escritura de artigos de lógica matemática (o excelente artigo do Paul Halmos How to write mathematics me auxiliou também um tanto). Com o da Costa escrevemos mais de 10 artigos conjuntos, em Francês e Inglês. O derradeiro se chama Is God Paraconsistent? (2020). Ademais escrevemos juntos um livro (do qual participou também Otávio Bueno) sobre a teoria dos conjuntos (em Português) e fiz a tradução do livro principal do Newton da Costa, Ensaio sobre os Fundamentos da Lógica, para o Francês.
Outra tradução que eu fiz do Português para o Francês, a pedido de uma amiga, a presidente da sociedade lacaniana em Paris, foi uma parte de Raízes do Brasil do Sérgio Buarque de Holanda (isso foi em 1994, ainda não tinha tradução em Francês deste livro). Mas o exercício de tradução não me apetece muito. Tem um artigo meu que foi traduzido em Português, O Suicido segundo Schopenhauer (publicado na revista Discurso da USP), mas não fui eu que fiz a tradução. A tradução não é um processo de escrita muito criativa, é mais um quebra-cabeça, e não tenho interesse a quebrar a minha cabeça. Praticar várias línguas é bom, mas traduzir é meio forçado (cf. o projeto de Barbara Cassin, Le Dictionnaire des Intraduisibles, do qual participa meu colega do PPGF/UFRJ, Fernando Santoro). Da mesma forma que podemos gostar de dirigir um Corcel 73, uma Opala Commodore, um Jeep Compass, mas transformar um Corcel em Jeep seria meio absurdo.
Todavia gosto da ideia de Raymond Queneau, que ele desenvolveu junto com François le Lionnais formando o grupo OuLiPo (Ouvroir de Littérature Potentielle), de seguir alguns restrições e regras. Queneau, um dos meus autores favoritos, começou como surrealista, mas depois ele achou meio bobo a escritura automática que consiste a escrever tudo que passe pela nossa cabeça, tanto que de seguir regras tradicionais (tal que a versificação alexandrina). A ideia dele foi: nem vamos escrever sem seguir regras, nem seguindo regras conhecidas, vamos sair dessa dicotomia, inventando e seguindo novas regras. Um clássico da literatura Oulipiana é A Vida Modo de Usar do Georges Perec, obra prima da literatura francesa do século vinte.
Este procedimento foi de fato o início da política na Grécia, com a criação de uma variedade de legislações por Licurgo, Sólon, Drácon, para citar os mais famosos legisladores da antiguidade grega. Mais na frente Jean-Jacques Rousseau fez um projeto interessante de constituição para a Córsega, e também um pouco depois foram formuladas A Constituição dos Estados Unidos (1787) e, na França, a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789). É importante que o ser humano não se torne escravo das leis, se lembrando que as leis foram feitas pelo ser humano, para o ser humano, e que sempre há possibilidade de ajustar, transformar, melhorá-las.
Na perspectiva Oulipiana, a criatividade é nas regras que inventamos e na maneira de escrever em função dessas regras, buscando o equilíbrio entre a forma e o conteúdo. Eu sigo essa metodologia quando escrevo.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Nunca tive dificuldade em escrever, mas a relação entre o pensamento e a linguagem melhorou. Eu consigo escrever cada vez melhor o que eu penso, e pensar o que estou escrevendo, fluí mais naturalmente, o que na filosofia não é obvio, além do fato que geralmente eu escrevo em Inglês, que não é a minha língua nativa. Mas isso, apesar de dar mais trabalho, pode ser uma vantagem. É bom ter um psiquismo menos automatizado e condicionado por uma ferramenta, a língua materna, que a gente apreendeu sem consciência, repetindo como um papagaio. Também um estrangeiro escrevendo em Inglês, pode, se consegue bem dominar as regras de base desta língua, escrever de uma maneira mais compreensível que um nativo, escrevendo um Inglês mais universal. Isso de fato é a continuação do que aconteceu com a transformação do Inglês britânico em Inglês americano. Um dos meus autores favoritos de língua inglesa é o autor americano Fredric Brown. Fiquei lendo as versões originais da obra dele para melhorar meu Inglês, escrevo então mais no estilo americano.
Uma coisa parecida aconteceu com o Português. Gosto muito do Português do Portugal, em particular o Fado, mas eu pratico mais o Português do Brasil. Para melhorar meu Português, fiquei assistindo novelas brasileiras na televisão, onde os atores têm uma pronúncia muito clara, escutando música e lendo livros. Do ponto de visto do estilo de escrita, um dos autores que gosto mais é Rubem Fonseca. Ele tem um jogo de linguagem que é muito agradável (e.g. Bufo & Spallanzani), um pouco equivalente à do Queneau, conhecido por ter transformado a língua francesa da rua numa coisa poética (e.g. Le Dimanche de la Vie).
Não diria nada especial para mim mesmo voltando atrás. Passei por uma série de transformações que foram interessantes. Minha língua nativa é o francês, minha mãe é originária da Suíça (Suisse Romande) e meu pai da França (Vendée). Na escola estudei Alemão, Inglês e Latim, e depois estudei sozinho Português (passei um primeiro ano no Brasil em 1991) e Polonês (fiquei um ano e meio na Polônia em 1992-1993). Comecei nessa altura a escrever principalmente em Inglês, uma língua que eu acho boa para articular o pensamento filosófico, porque ela é mais direita, mais simples, mais flexível, e ao mesmo tempo tem uma boa riqueza de vocabulário e expressões idiomáticas (Every cloud has a silver lining…).
Esses últimos cinco anos passei para uma outra dimensão, escrevendo textos (em Inglês, Francês ou Português) usando sistematicamente imagens. Comecei a fazer isso escrevendo um artigo sobre a imaginação … Levei quase 10 anos antes de sentar e escrever o artigo Possibility, Imagination and Conception, que foi publicado em 2016. Comecei a conversar sobre este assunto em 2006 com Alexandre Costa-Leite, que na época era meu doutorando e assistente na Suíça (hoje é professor do Departamento de Filosofia da Universidade de Brasília – UnB), e que foi um dos primeiros a elaborar uma lógica da imaginação. Organizei em Neuchâtel na Suíça (cidade de Jean Piaget) um congresso interdisciplinar sobre essa temática em 2007, deu aula sobre o assunto no Departamento de Psicológica da Université de Neuchâtel, e os anos seguintes fiz palestras no mundo inteiro sobre a imaginação.
Nessa metodologia, o uso das imagens não se reduz a ilustrações, mas as imagens são usadas para desenvolver o pensamento, o entendimento. Isso para mim é natural porque na matemática se pratica isso. Todavia fazer isso na filosofia é um certo desafio, frente a condenação original das imagens por Platão. Mas de fato ele mesmo usa “imagens”, tal que a alegoria da caverna.
Fiz meu mestrado de filosofia sobre essa alegoria. Escrevi um texto ficcional satírico em três partes: uma aula de um professor de colégio (interpretação clássica flutuando no céu das ideias), uma conversa sobre a interpretação do filósofo da Floresta Negra, Martin Heidegger (paródia do Jean Beaufret – fui aluno de um aluno dele no Lycée Henri IV), uma palestra na Nova Acrópole (misturando neoplatonismo, plotinismo e filosofia New age). Também juntei neste mestrado representações visuais da caverna (a mais famosa é a pintura de Pieter Jansz Saenredam, 1604). A minha orientadora, Sarah Kofman, gostou muito. Fazer filosofia ficcional sobre Platão é mais do que logico…
Recentemente editei um livro de cerca de 1.000 páginas sobre a imaginação, em conjunto com Daniel Schulthess, ex-colega meu de Neuchâtel , resultado de um evento sobre esta temática que organizei na praia no Leme no Rio de Janeiro em 2018, com a benção de Clarice Lispector. No capítulo introdutório deste livro, que é tudo em Francês, porque o evento foi promovido pela ASPLF – Associação das Sociedades de Filosofia de Língua Francesa (Schulthess era presidente dessa organização, agora ele é presidente de honra), eu falo sobre as línguas, dizendo que escrever tudo numa língua só seria a mesma coisa que fazer música usando sempre o mesmo instrumento, por exemplo o piano. Me parece importante não só ler e falar diferentes línguas, mas também escrever em várias línguas.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Gostaria de escrever uma novela de bom tamanho, tipo a Montanha Mágica de Thomas Mann. Quando tinha cerca de 25 anos, escrevi uma série de 10 contos e depois uma pequena novela de 60 páginas, L’Oubli de Vivre (O Esquecimento de Viver).
Mas até agora não escrevi um texto de ficção de grande tamanho. Preciso de uma ideia original de base, uma boa trama, um fio condutor, que ainda não apareceu. Uma vez que aparece tal ideia diretriz, vai ser fácil escrever.
Sobre o livro que não existe, gostaria de ler um guia de turismo sobre o Paraíso, um dos países sobre os quais estou trabalhando no momento, junto com Caroline Pires Ting. Um bom guia, explicando as melhores maneiras de chegar lá (pessoalmente preferiria ir de barco, me parece mais romântico, um cruzeiro, mas não sei se ainda é possível), quem necessita de um visto, o que há de interessante para ver e fazer lá (museus, monumentos, zoos, castelos, praias), dicas sobre bons hotéis e restaurantes, indicações sobre como se comunicar com os indígenas (se é possível falar puppy-guarana), informações sobre a taxa de câmbio, descontos para pessoas provenientes de país com low currencies, os transportes locais, o clima (se é prudente levar um guarda-chuva), se é recomendávelcontratar um seguro de repatriamento, se é possível levar meu gato… Do’s and Dont’s.
Um guio do Paraíso com mapas, fotografias e ilustrações! Ademais, nas circunstâncias atuais, dizendo quais são as vacinas aceitas para entrar là (Oxford-AztecaCaneta? CoronaVacas? BoutenTrain?) e quanto tempo de quarentena temos que esperar no purgatório assistindo televisão comendo pipocas.