Jardel Amaral é médico e escritor.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu, como a maioria dos autores brasileiros não vivemos exclusivamente da escrita. Acordo por volta das 5:30h e vou exercer a profissão de médico que abracei há 28 anos, por isso, tenho pouco tempo livre para escrever. Apesar de ter iniciado mais tarde na escrita, descobri algo que me completa e hoje não consigo viver sem. Mesmo sem muita disponibilidade de tempo para escrever e ler, sempre consigo gerar momentos para a escrita e leitura.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Gosto mais de escrever pela manhã, mas por questão de tempo tenho produzido mais à noite. É uma situação que não me incomoda, pois o prazer de escrever me faz bem a qualquer hora. Produzir escrita me faz por alguns momentos sentir que atingi o nirvana, curado de todo sofrimento, dentro de uma realidade paralela e num mundo em que sou senhor. O resultado de tudo isso é a manutenção da minha sanidade. Existe algo que ao escrever que me faz concentrar e despertar o meu eu criativo. Esta particularidade é ouvir “Rock and Roll”. A minha playlist é extensa, mas passeia muito pelos anos 80 e 90.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Priorizo escrever mais no final de semana, mas durante os outros dias, quando tenho força e inspiração, sento-me para criar. Também, em raros momentos durante uma parada rápida para almoçar no período de trabalho, pego papel e caneta vindo a continuar do ponto da história onde havia parado, pois tenho o enredo e as próximas linhas na minha mente. Depois passo tudo para o computador. Toda vez que escrevo tenho uma meta mínima de uma lauda, mas se o tempo e a inspiração permitirem produzo o quanto der.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Para criar um romance eu escrevo num caderno um resumo de tudo que vou escrever, a mensagem que desejo passar ao final e as características dos personagens principais. Gosto mais de narrar na 1ª pessoa, mas posso usar a 3ª pessoa. Começar para mim não difícil e como tenho a espinha dorsal do romance pronta, tudo vai ganhando forma. No conto, na crônica e no poema, eu com ideia fervilhando na cabeça, paro diante de meu computador ou até uso a caneta e a folha de papel. A coisa flui ao natural. Tenho sempre um pequeno caderno comigo e tudo que vem a minha cabeça sobre o que estou escrevendo anoto e depois coloco no texto. A pesquisa pode ser feita antes ou durante a criação. Comigo a pesquisa inicial é para a criação do enredo e dos personagens. Durante o desenvolvimento do romance há sempre a pesquisa em que você é levado pelas linhas escritas, necessitando ambientar tudo ou contar uma história dentro da história.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Eu não consigo travar durante a escrita, mas tem momentos em que as coisas andam bem devagar, então, dou uma parada e depois continuo. Não me lembro de ter procrastinado no ato de escrever, pois consigo sempre me manter ativo. Só parei uma vez e foi no meu último romance, por motivo de doença. Sempre tenho o receio de ficar uma porcaria. Isso surge no final projeto junto com a ansiedade para que tudo seja publicado e venha existir uma boa receptividade.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Faço a revisão por várias vezes. No meu último romance publicado, “Corrompidos”, revisei dez vezes no mínimo. Lembro-me que escritor japonês Haruki Murakami disse algo mais ou menos assim: “Não há nada que está bom, que não possa ficar melhor”. Tenho o hábito de sempre mostrar o que escrevo para alguém, normalmente é um escritor amigo meu, mas pode ser uma pessoa que leia com frequência.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Tenho sempre um computador conectado a internet, que é muito útil para pesquisas rápidas. Salvo os meus arquivos também e um pendrive. Não consigo produzir sem ajuda da tecnologia. Sempre coloco tudo que escrevo no computador, mesmo que tenha escrito numa folha de papel durante o meu dia, pois logo ao chegar em casa passo tudo para ele.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
As ideias surgem de repente na minha cabeça e sempre associadas com a minha vivência, ao meu dia a dia, ou algo que tenha lido nos veículos de informação. As experiências de pessoas com que eu tenha convivido ou conviva, são uma ótima fonte para criação. Com tudo em mente e a pesquisa sendo realizada, ficciono em volta do enredo idealizado.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Encaro que a cada texto que escrevo como um processo de evolução, buscando fazer algo melhor, mas não fugindo do objetivo de contar uma boa história. Algo que gosto de fazer que não fazia no início era contar um fato ou algo histórico dentro da narrativa. Existe um romance histórico feito por mim quando comecei, que pretendo reescrevê-lo no futuro, pois acho do modo como escrevo hoje, ele talvez venha a ter um resultado final muito melhor.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria muito de ter mais tempo para ler e escrever. Nada tão frequente, mas regular e assim iniciar um projeto de roteiro para TV e cinema. Não consigo idealizar um livro que gostaria de ler, pois são tantos na história da humanidade, que é só procurar. O problema algumas vezes é achá-lo. Também há aqueles livros que ainda estão por vir e no futuro tomaremos contato. Tem uma coisa que não abro mão na leitura, que é se divertir.