Gustavo Piqueira é escritor e designer.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Tenho, das mais banais: acordar, tomar um iogurte, um café, um banho e ir para o estúdio. De segunda a domingo, invariavelmente.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Em primeiro lugar, aquilo que considero como minha escrita vai além do manejo da linguagem verbal. Todo elemento que desenvolvo em meus livros — textos, imagens, projeto gráfico, materialidade — faz parte da minha escrita. E, como a elaboração de cada um possui particularidades das mais diversas, é natural que não haja um único horário ou entorno que eu possa apontar como meu preferido para a execução de todos eles. Também não tenho nenhum ritual específico. A não ser, claro, ficar sozinho.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Em períodos concentrados, mas com brevíssimos intervalos entre eles. Não tenho uma meta diária — tenho, contudo, um limite diário conhecido e sei que nada que ultrapassar esse limite terá sido executado com grande esmero ou clareza.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Em função da variedade estrutural dos livros que faço, não há um único processo ou movimento pesquisa > escrita — na verdade, a diferença essencial entre cada livro está intrinsicamente vinculada à especificidade do processo que elaboro para executá-lo. Dessa maneira, o processo não é apenas um caminho, um meio, mas parte fundamental da narrativa que se materializa no livro.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Infelizmente, já não nutro grandes expectativas ou ansiedades. (O lado bom disso é que, ao menos, não sofro com essas travas.)
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes. Não consigo precisar um número, mas são muitas vezes — em geral, contudo, elas consistem em revisões mesmo, quase nunca em descartes ou refações mais drásticas. E, dependendo do projeto eu mostro, sim.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Textos eu escrevo sempre no computador. Já as imagens tem um percurso mais livre: às vezes começam no computador, às vezes no papel. E, não raro, ficam saltando de um para o outro até ficarem prontas.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Confesso, tenho certa preguiça com a atual utilização do termo “criativo”. Também acho que um livro não é exatamente uma reunião de “ideias”. Penso em meus projetos mais como oportunidades de elaboração e materialização de perguntas, hipóteses ou brincadeiras (de preferência todas as três coisas juntas) do que como a “criação” de uma obra.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Essencialmente a incorporação de outras linguagens e dimensões ao conceito do que é escrita. E acho que, se eu tivesse a oportunidade de reencontrar-me comigo mesmo no passado, eu agradeceria o convite mas arranjaria alguma desculpa para não comparecer ao evento.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Todos os projetos que sei que gostaria de fazer, de um modo ou de outro já começaram a ser feitos — o próprio desejo sinaliza esse começo. Mesmo porque, o “fazer” se projeta para muito além do momento ao qual ele habitualmente é reduzido. Começa bem antes desse momento e se estende bastante à frente. Sobre os livros que eu gostaria de ler, penso que — impressos ou não — eles já existem, sim. Eu é que ainda não os conheço.