Elieser Cesar é jornalista e escritor, autor de O azar do goleiro (novela), A garota do outdoor (contos) e Ciranda de Maria Cecília (poesia).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Depois de me levantar, não muito cedo, pois tenho o hábito de leitor noturno, me preparo para o trabalho, a sobrevivência diária. Quando estou escrevendo, acordo mais cedo ou durmo mais tarde, para continuar a história. No meu caso, não há uma ordem estabelecida para a produção literária.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Geralmente à noite. Com silêncio ou uma música clássica, Bach, Mozart, Beethoven ou Chopin, de preferência. Não há nenhum ritual. É sentando e escrevendo, na medida em que as ideias chegam. Aquela coisa de 90% de transpiração e 10% de inspiração, como dizia, salvo engano, William Faulkner.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Como a profissão de jornalista absorve muito tempo, não tenho períodos determinados para escrever. Escrevo quando sobra tempo e quando tenho algo que julgo interessante ser dito.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Quando surge a ideia, começo a escrever. E procuro seguir um bom conselho de Gabriel Garcia Márquez: não interromper uma história sem saber como irei continuar no dia seguinte.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Às vezes, quando o texto empaca feito um jumento teimoso, o jeito é adiar, e procurar a melhor solução para continuar a história, que pode chegar num estalo ou demorar um pouco tempo, talvez, alguns dias. Isso me faz lembrar aquela velha frase do Barão de Itararé: “De onde menos se espera é que não sai nada mesmo”. Neste caso, a procrastinação é o melhor caminho. O medo de não corresponder às expectativas é normal em quaisquer áreas da criação artísticas. Então, superá-lo se torna o primeiro desafio.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Neste terreno, sou partidário de Graciliano Ramos, para quem o essencial era cortar, desbastar o texto. Quando estou revisando um texto, lembro sempre do poema “Catar feijão”, de João Cabral de Melo Neto. Então, procuro separar a boa semente do gorgulho das palavras.
Antes da publicação, posso até mostrar a história a um amigo em cuja opinião confio e em cujo gosto respeito. Antes terminar a história, não vale a pena, se o próprio autor ainda tateia em terreno movediço.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Poesia, sempre à mão, uma vez que a ideia do poema pode surgir em qualquer lugar, como numa mesa de bar. Daí sempre procuro andar com uma caneta no bolso. Neste caso, um guardanapo serve para o esboço ou a primeira versão do poema. Depois, ao chegar em casa, passo para o computador, para um arquivo o que escrevi. Quase nunca é a versão definitiva. O poema pode esperar mais um pouco, ficar numa espécie de quarentena, até que o autor esteja satisfeito com o resultado. Não é um pão que se tira do forno e se vai, logo, servindo à mesa.
Prosa, em geral, já faço no computador; embora tenha a escrito alguns contos à mão e depois digitado no computador. Também gosto desse caminho, pois, aproveito para ir corrigindo, burilando, suprimindo ou acrescentando a depender da necessidade de reparos.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
O hábito principal é a leitura. Dos clássicos aos contemporâneos. Na poesia ocorre um fenômeno instigante: quando leio um bom poema, desperta, latente, inconscientemente, em mim, um desejo de escrever um poema; como se a leitura precedente nos deixasse em um estado pré-poético de alerta; acendesse uma fogueira lá num canto mais sensível da alma.
O hábito da leitura é o melhor manual de escritor; embora não garanta que vai tornar nalgum um escritor; da noite para o dia ou dia para a noite; mas, em caso afirmativo, dará régua e compasso para o futuro escritor. A régua da tradição e o compasso do talento individual, numa expressão eliotiana.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Sem dúvida a conquista de um estilo mais simples e desbatado. Na arte, o difícil é a conquista da simplicidade. Escreve de modo simples, como quem conversa, como quem respira.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Um romance sobre a minha geração. Aquela viu a redemocratização do Brasil, da campanha das diretas ao impeachment de Dilma Rousseff e também o sonho de um país melhor ser malbaratado, ao longo dos anos, pelos anões da política e os gigantes da torpeza moral. Esse mesmo livro, que poderia se chamar, Brasil, o país do passado!