Denise Emmer é poeta, autora de dezenove livros.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Dentro de algumas variações, tenho uma rotina matinal.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
A depender do período e da disponibilidade, o horário pode variar. Ritual não tenho. Porém, preciso do silêncio e solidão.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Já escrevi poesia dias seguidos no mesmo horário. Outras vezes, em horários diferentes. Depende de muitos fatores, tais como, poder estar comigo mesma e sem interferências externas, seja quais forem.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu não faço pesquisas. Escrevo de forma criativa e espontânea. Deixo as ideias chegarem de algum lugar que deve ser o meu interior, a minha alma. As reminiscências.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Não sofro de procrastinação, pois penso que a escrita tem o seu tempo de acontecer. No entanto, após escrever um livro que foi, não somente objeto de boas críticas, bem como, premiado, me preocupo se conseguirei superar. Se escreverei outro de igual nível ou melhor.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Reviso muitas, muitas vezes. Busco palavras ideais. Escrevo frases inacabadas, sabendo que haverá uma palavra com o som e o ritmo imaginados, para assim completá-la. Não mostro a ninguém, antes de dar por terminado o texto poético. Há uma certa magia no segredo. E prefiro escrever em segredo, para que possa penetrar nesse mundo que construo sozinha, a permitir a chegada dos temas, imagens, palavras… É como se ao revelar, perdesse a graça e o desejo de criar.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Minha relação com a tecnologia é ótima. Usufruo o que ela tem de melhor, sem extrapolar em vícios bobos, tais como, viver atrelada às redes sociais. Os poemas eu os escrevo à moda antiga, num caderno especialmente escolhido. Já, a prosa, vai direto no programa do computador, que me dá a forma e, também, o conforto de visualizar a impressão.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Não sei de onde vêm minhas ideias. Não programo escrever. Acontece. Vem do inesperado momento. E o momento certo, é aquele em que me disponho a criar mundos.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Posso afirmar que a mudança está no amadurecimento em todos os sentidos, no que diz respeito a qualidade do texto. Sem generalizar, pois, que há poemas de 20 anos atrás, que se encontram no mesmo nível dos mais recentes. O que posso dizer, é que temos lampejos, iluminações em dados momentos da vida. E essas iluminações podem acontecer mesmo quando somos muito jovens. Ou não.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Meus projetos são sempre mistérios, uma vez, como já disse, eu nada programo. Mas, tenho o projeto de ter muitos projetos. Penso, ao longe, vagamente, silenciosamente, ouvindo alguns sinos baixinhos de minha alma, de escrever um grande romance. Quero dizer, não necessariamente “grande na qualidade”, mas na extensão. Como se fosse uma volta ao mundo, a pé.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Depende do que me proponho a escrever. Poemas, eu não programo porque são ideias e imagens que acontecem de maneira espontânea, e ocorrem a qualquer momento. Sendo assim, deixo fluir. Para essa situação sempre levo comigo caneta e um pequeno caderno. Anoto os versos para depois os desenvolver num momento especial. A poesia, não escrevo diretamente no computador, mas em cadernos. Gosto de cadernos com capas coloridas para escrever poesia. É lúdico. Já os contos e romances, eu programo. Após a ideia de um enredo principal, faço um projeto geral da história. Se não for assim, corro o risco de me perder ou me repetir. Quanto ao que é mais difícil? A primeira frase com certeza. Esta haverá de ser aquela a impactar e prender o leitor para que este prossiga no poema ou na história.
Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Como sou violoncelista, tenho que me dividir entre a música e a literatura. Em geral, estudo as peças musicais de manhã. À noite, quando o mundo faz silencio, eu mergulho nas palavras, seja poesia, conto ou romance.
O que motiva você como escritora? Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita?
Revelo que a poesia foi acontecendo em minha vida desde muito jovem, quando tinha uns 10 anos de idade. Nas aulas de literatura, fui apresentada a poesia de Cecilia Meireles e me encantei completamente. Nessa época, iniciei os primeiros rabiscos poéticos que eram muito bem considerados pela professora. Lembro-me de escrever tudo em versos. Até mesmo redações sobre temas realistas eu tentava transformar em poesia. E não parei mais de escrever, tanto que publiquei o meu primeiro livro aos 16 anos: “Geração Estrela” Editora Paz e Terra, com orelhas do poeta e editor Moacyr Félix. Um grande escritor e intelectual, que muito me incentivou a prosseguir no caminho árduo da poesia.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Algum autor influenciou você mais do que outros?
A voz própria acontece com o tempo. Creio que inicialmente, como relatei na pergunta acima, minha grande influencia tenha sido Cecilia Meireles. Acho que enquanto não alcançamos o estilo próprio, somos um pouco de tudo o que lemos. E aí, entram Drummond, Augusto dos Anjos, Rilke, Dylam Thomas, entre outros. Porém, no meu quarto livro, “A Equação da Noite” Ed Philobiblion, prefácio de Pedro Lyra, creio ter encontrado a minha voz poética. O prefaciador assim o reconhece no texto introdutório.
Você poderia recomendar três livros aos seus leitores, destacando o que mais gosta em cada um deles?
Dos meus livros, eu recomendo o mais recente. Minha estreia no gênero conto “O cavalo cantor e outros contos” Ed Espelho D’alma, 2019. Com um belo prefácio e ilustrações do poeta Álvaro Alves de Faria, e orelhas do ensaísta Cyro de Mattos. A razão pela qual o indico é por se tratar, a meu ver, de uma conclusão de toda minha obra. Ou seja, conto histórias surreais com a linguagem mágica da poesia. São 11 contos, cuja temática predominante é o sentimento de solidão como sombra invisível a habitar as palavras. Igualmente a ausência que sufoca os seres para uma noite que parece nunca terminar. Outro livro de minha autoria para sugestão é o “Poema Cenário e outros silêncios. Ed. 7letras, 2015. O longo “Poema Cenário” aqui, na integra, cuja temática é a dolorosa perda abrupta de meu pai, e uma reflexão poética sobre fugacidade da vida. Os “outros silêncios”, são poemas de outros volumes, escolhidos a dedo, para compor. Não é uma antologia. O terceiro a recomendar seria o “Lampadário”, vencedor do Prêmio ABL de poesia 2009. Uma das minhas melhores coletâneas poéticas. A conferir o prefácio do excelente Alexei Bueno. E, finalizo aqui, indicando a leitura de três grandes poetas brasileiros atuais. São eles: Alexei Bueno, Álvaro Alves de Faria e Sergio Castro Pinto.