Dênis Rubra é escritor, autor de autor de Poetisando a vida (2010) e É muito cedo pra pensar (2017).
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Já tive muita rotina. Mas sempre tentei fugir dela. Há escritores que funcionam melhor com disciplina e com uma rotina bem estabelecida. Eu, talvez porque escreva mais poesia que prosa, e talvez porque concilie essa produção literária com o meu trabalho de editor, vivo uma dinâmica na qual nenhum dia é igual ao outro. Os prazos de cada leitura e produção editorial, somados aos meus compromissos pessoais e reuniões de trabalho é que definem, dia a dia, como a manhã começa e como a noite termina. Mas poderia afirmar que em geral dedico as manhãs para leituras; as tardes para compromissos pela cidade e as noites para leituras e/ou escrita.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Com certeza a noite é o horário do dia em que me sinto mais a vontade para escrever. Talvez por causa do silêncio. Não sei. Talvez porque à noite não chegam tantos e-mails como de dia, o fluxo de mensagens, ligações e demais distrações diminui. E aí a mente migra para um estado de internalização que favorece a minha produção.
Sobre rituais, bem, não tenho. Já tive alguns. Mas recentemente acredito que o meu único ritual seja não escrever quando a ideia me ocorre. Em geral rascunho algo e guardo para rever depois e, aí sim, trabalhar.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo pouco, muito pouco. E por enquanto não tenho metas. Para você ter ideia, seis anos se passaram entre o primeiro e o último poema do meu livro. É muito cedo pra pensar.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Me faz essa pergunta de novo daqui uns meses? Talvez daqui um ano? Porque, nesse momento, estou começando um livro novo, de prosa, e estou na fase das notas.
Ainda não sei como vou me mover daqui para a escrita. Pretendo descobrir. Ou não. E aí nunca saberei responder a essa pergunta.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Vou a sambas. Vejo os meus amigos. Ouço “Transa”, do Caetano. Vejo ou revejo um filme. Uma série. Ou então releio trechos de livros. Faço coisas que me distraiam a mente e me ajudem a voltar para o estado de concentração que preciso. Quando a coisa não flui, não adianta forçar.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Até hoje eu publiquei dois livros, ambos de poemas. O primeiro foi uma bagunça. Revisei pouco. Mostrei para algumas pessoas, mas ignorei as opiniões de que não gostei. O resultado foi um livro bastante infantil, na minha opinião. E com pouca coisa de que se orgulhar, mas zero coisa de que se envergonhar porque, afinal de contas, não vou ter vergonha dos erros que me ajudaram a acertar depois.
O segundo livro não. Nem consigo contar a quantidade de provas que ele teve. Eu próprio editei com meu sócio, o Mauro Siqueira, e o enlouqueci com a quantidade absurda de emendas durante os dois anos que durou a produção. Se eu fosse meu autor, sinceramente, distratava o contrato. Mas o Mauro aguentou. E alguns amigos, entre editores e poetas, ajudaram bastante, opinando durante os processos – de escrita e de edição.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Já nem me lembro da minha caligrafia. Quando eu penso na minha letra, enxergo Garamond, tamanho 12.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Depende. Eu acho que em se tratando de poesia as ideias vêm de uma necessidade que me captura por alguma razão. Um incômodo, uma perturbação. Quando eu contemplo algo, como a beleza da cidade ou o caos urbano no engarrafamento (ambos convivendo também).
A conjuntura política que a gente vive aqui no Brasil. Esse golpe que a Dilma sofreu, por exemplo, mexeu comigo. E aí uma necessidade de escrever a respeito me captura.
Uma vez capturado, eu persigo as ideias. E nas poucas vezes que as alcanço, é quando consigo alcançar o poema.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
O que mudou no meu processo de escrita é que hoje eu percebo essa prática como algo mais profissional, talvez. Menos inspiração e mais transpiração. Se eu pudesse dizer algo a mim no passado, eu diria para escrever “poetisando” com z, no título do meu primeiro livro (poetisando a vida).
Eu provoquei esse erro de ortografia de propósito. Mas ninguém entendeu. E hoje em dia nem mesmo eu entendo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu gostaria de conseguir ler as dezenas de livros que eu tenho e que eu nunca vou ler. Por falta de tempo. E porque mesmo que eu tivesse uma eternidade disponível ainda assim não seria possível. Tem muita coisa boa pra se conhecer. E coisa inclusive que está escrita em idiomas que a gente nem sabe ler. Uma pena. O segredo é se contentar com o fato de que todos nós vamos morrer ignorantes.