Cláudia Tavares Alves é professora de literatura, pesquisadora e tradutora.
Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Gosto de acordar cedo, tomar café da manhã com calma e ler alguma coisa. Acompanhar as notícias tem sido cada vez mais insuportável, então tento ler algumas páginas do livro que estiver mais perto.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Na parte da manhã, sem dúvida, consigo me concentrar melhor. Não sei se chega a ser um ritual, mas deixar o ambiente organizado, limpo, em silêncio, com uma boa luz, me ajuda bastante a estar bem e me sentir confortável para escrever.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Escrevo todos os dias, às vezes mais, às vezes menos. Acho que depende das demandas mais imediatas, mas sou capaz de ficar muitas horas se precisar entregar algo com prazo definido, por exemplo.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Sou uma pessoa que escreve muito mentalmente, isto é, que prepara o texto na cabeça antes de colocá-lo para fora, e essa ruminação de ideias leva tempo. Além disso, aprendi a ser mais objetiva e a desenhar um projeto de texto sempre que preciso escrever alguma coisa. Também faço anotações em papéis, cadernos, post-its, blocos de nota no computador ou celular, o que me ajuda nesse processo de pensar. Mas escrever de fato o texto é, em grande medida, já tê-lo escrito mentalmente. Também é fundamental o momento posterior à escrita, em que deixo o texto em decantação e me esqueço dele antes de revisá-lo. Essa revisão, na minha opinião, é tão importante quanto qualquer outra etapa da pesquisa: é o momento em que o que existia em forma de pensamento precisa existir em forma de texto capaz de se comunicar com outras cabeças. Então eu mesma preciso me tornar estranha a ele para poder enxergá-lo de outra maneira.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Acho que em outros momentos essas questões foram mais fortes para mim, mas hoje dou menos importância a elas. Isso vem de uma certa tranquilidade em aprender a me respeitar e a confiar no fato de que preciso fazer o que consigo fazer e não o que imagino que os outros esperam que eu faça. Mas, em geral, em momentos de maior angústia, minha estratégia é ser pragmática e começar: um começo ruim, desajeitado, suprimível, mas um começo. A gente só caminha se der o primeiro passo. Também acho importante estabelecer uma rotina, trabalhar um pouquinho por dia: devagar e sempre. Em casos extremos de angústia, tomar banho.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Tudo depende dos prazos, mas em geral gosto de revisar mais de uma vez. E, sempre que possível, mostro para pessoas em quem confio. Confiar significa saber que elas farão uma leitura crítica e honesta.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
No computador. Gosto muito de escrever à mão e mantenho agendas, inúmeros cadernos e bloquinhos porque é assim que penso e organizo as minhas bagunças. Mas quando avanço para a escrita de fato, preciso do computador para visualizar um texto para além de um rascunho.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Acho que existem dois fatores fundamentais para as minhas ideias surgirem. Em primeiro lugar, do fato de ler o máximo possível, sobre tudo. Em segundo lugar, do fato de estar no mundo, viver o mundo, prestar atenção no mundo. As experiências de leitura e escrita se conjugam às minhas experiências de vida, aos meus interesses, ao olhar que deposito sobre a realidade. Então essas duas operações se complementam e das faíscas entre elas surgem as ideias.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Hoje me sinto mais confortável em usar a primeira pessoa. Também sinto que aprendi a diferenciar melhor os tipos textuais, quais as interlocuções adequadas e os estilos particulares de cada texto, o que me deixa menos ansiosa diante de um novo começo. São tranquilidades que vêm com a prática, acho, com esse ensaio recorrente do ato de escrever. Também penso que hoje consigo calibrar melhor as pressões, os prazos, quanto tempo vou demorar para escrever, sejam 2 ou 100 páginas, por me conhecer melhor e saber dos meus próprios caminhos. Eu me diria: não leve a vida tão a sério.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Uma vida sempre me parece pouco tempo para levar adiante todos os projetos, mas os mais imediatos são me dedicar à tradução literária e também realizar um projeto de pesquisa que pense literatura italiana e literatura brasileira juntas- mas não consigo dizer mais do que isso por enquanto. Eu gostaria de ler uma história da literatura, nacional e mundial, que falasse de escritoras mulheres na mesma medida em que falasse de escritores homens – todo desejo é um projeto?