Carol Vidal é escritora, jornalista e podcaster.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu não sou uma pessoa de muitos rituais, mas adoro as manhãs. Eu acordo bem cedo para ir para o trabalho, então, minha rotina é comum: levanto, tomo banho, tomo café, arrumo minha marmita (se não o tiver feito no ia anterior) e vou para o trabalho. Nada de muito diferente. A única “variação” é que de vez em quando coloco algum vídeo no Youtube para me distrair enquanto tomo café, geralmente algum sobre livros.
Curiosidade banal: quando falo tomar café, é apenas relacionado à primeira refeição do dia. Eu não bebo café porque me faz mal.
Durante mais de dois anos da pandemia, em que trabalhei de casa, minha rotina mudou um pouquinho. Eu continuei acordando bem cedo, mas, antes de levantar, gostava de ler um pouco (normalmente no Kindle). Era o tempo de eu sentir fome, e aí levantava para tomar café e seguia o dia. Sinto falta de fazer isso agora que voltei ao presencial.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Como disse na resposta anterior, eu adoro as manhãs, pois é o momento do dia em que minha energia está lá em cima. Passou do horário do almoço, é só ladeira abaixo! Por esse motivo, com certeza as manhãs são meu momento preferido para escrever, porém, só consigo fazer isso quando estou de home office.
O que tento fazer na rotina de trabalho presencial é escrever enquanto o dia ainda está claro, seja em algum intervalo do trabalho (geralmente o almoço) ou quando chego em casa, mais pro final da tarde. Fim de semana eu costumo descansar, a não ser que tenha algum prazo e eu precise escrever.
Eu não tenho nenhum ritual de preparação para a escrita, mas procuro sempre um ambiente silencioso. Eu me distraio muito fácil, e até música instrumental me atrapalha. Por conta disso, sempre que lembro, coloco o celular no silencioso e fecho abas que possam me distrair pra me ajudar a me manter focada.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Eu sou uma pessoa de fases e tenho o péssimo hábito de, muitas vezes, só escrever quando já tenho um objetivo especifico, tipo participar de algum edital ou mandar um texto para algum lugar especifico que me peçam. Esse é um costume que venho tentando quebrar nos últimos tempos, e até consegui escrever uma história sem um objetivo especifico além da vontade que me deu.
Eu tenho buscado encontrar uma maneira de me manter mais constante na escrita, mesmo que não seja todo dia, mas que tenha uma frequência, porque, para além de publicar e querer ser lida, eu escrevo porque gosto e me faz bem. Mas não vou mentir que prazos são um ótimo motivador para mim.
No momento em que respondo essa entrevista, estou fazendo uma mentoria para me ajudar na escrita de um romance, então, estou aproveitando para me encontrar em uma rotina de escrita mais constante, uma vez que esse é um projeto mais longo (e eu tenho mais costume de escrever histórias curtas). E, como tenho reuniões periódicas, preciso escrever pra ter o que apresentar para discutir.
Ainda não posso dizer que encontrei o ritmo ideal (não vou mentir que ainda estou me acostumando com a volta ao trabalho presencial), mas estou caminhando nesse sentido. Por favor, mandem mensagens de incentivo nas minhas redes!
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Com base no que respondi acima, mais do que começar, minha maior dificuldade é manter o ritmo durante a escrita. E, para que esse processo seja mais tranquilo, eu preciso ter uma mínima noção de para onde quero caminhar com a história. Eu não sou o tipo de escritora que consegue navegar em águas totalmente desconhecidas para ir descobrindo a história no caminho. Preciso de um mínimo roteiro par me guiar, por mais que muitas coisas mudem ao longo da escrita.
O que eu percebi, portanto, é que tendo essa base solidificada, fica mais fácil continuar escrevendo, porque meu eu do passado já pensou em para onde a história vai caminhar, o que me poupa grande esforço de ficar quebrando a cabeça para pensar no que escrever a seguir.
Foi isso, inclusive, que me fez procurar a mentoria para escrever esse romance em que estou trabalhando agora. Eu cheguei num ponto em que não sabia mais para onde caminhar com a história e precisava de ajuda para destravar a escrita. Tem sido um processo novo e muito interessante para mim, porque é a primeira vez que alguém está lendo e comentando enquanto eu ainda estou escrevendo.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Nossa, a procrastinação é a grande pedra no meu sapato! Não se enganem ao ver que vários contos meus foram publicados por aí: eu sou MUITO preguiçosa e enrolo demais pra fazer qualquer coisa, por mais que eu ame essa coisa, como é o caso da escrita. E o fato de a literatura não ser o que me sustenta financeiramente me faz ser bem relaxada com o volume de produção. O que é bom por um lado, porque tira parte da pressão, mas ruim por outro, porque é muito fácil empurrar para outro momento.
A minha cabeça funciona a mil e isso muitas vezes também atrapalha a escrita, porque eu ainda estou em estágios iniciais e minha mente já está lá na frente pensando pra onde posso mandar a história, como divulgar, como poderia ser a capa, o que as pessoas vão achar… E isso atrapalha demais, porque eu deixo de aproveitar o processo, sabe? Perde aquele frio na barriga gostoso de me divertir e me envolver com a narrativa que estou criando.
Então, eu tenho tentado sempre dar uma respirada e, no momento de escrever, deixar todas as preocupações de fora enquanto eu curto o processo. Porque, da escrita à publicação, é um caminho muito longo, e se o processo for penoso, fica difícil contornar a ansiedade.
Fora que a gente vive nesse mundo louco das redes e algoritmos que cobram uma quantidade absurda de produção pra você se manter relevante nesse meio. Mas eu não posso me deixar contaminar por isso, ou eu vou ser sugada pela ansiedade de querer publicar logo alguma coisa, e é aí que não vai sair nada mesmo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Eu não tenho um número de vezes fixa em que leio meus textos antes de publicar, mas uma coisa é fato: nada meu vai para o mundo sem que alguém leia antes.
Não é sempre que acontece assim, porém, vou tentar traçar aqui um mínimo roteiro de como costumo fazer quando publico de forma independente: escrevo um primeiro rascunho e deixo um tempo o texto descansando; dou uma relida e mexo no que achar necessário; mando para amigos fazerem leitura beta (umas 2 ou 3 pessoas no máximo); modifico o texto mais uma vez de acordo com os comentários; contrato leitura critica; mexo no que mais for necessário; e aí mando pra um profissional fazer a preparação.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Eu sou uma pessoa totalmente da tecnologia nesse sentido. Embora adore itens de papelaria, na hora de escrever, faço direto no meio digital.
Recentemente, comprei um tablet e um teclado bluetooth e é por ele que escrevo na maior parte das vezes (é por onde estou respondendo essa entrevista, inclusive). O fato de ser mais compacto que o notebook me dá liberdade pra escrever em qualquer canto com conforto. Tem funcionado bem!
Porém, meu envolvimento tecnológico para por aí. Sei que tem escritores que usam softwares específicos pra escrever, mas não é o meu caso. Costumo escrever pelo Google Docs (o que me permite abrir o arquivo de qualquer dispositivo) e é também onde monto o planejamento de escrita, ficha de personagem e o que mais precisar. Pra ficar mais fácil, organizo tudo dentro de uma pasta específica para o projeto em que estou trabalhando.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Além de literatura, eu gosto muito de música, e já tirei muita ideia de história ouvindo diferentes canções; tenho, inclusive, uma zine com cinco pequenos contos inspirados em músicas. No mais, acho que é um exercício de observação mesmo. Às vezes ouço alguma coisa que me dá uma ideia, ou simplesmente me dá vontade de escrever sobre algo sem nem saber direito de onde veio. Acho que também sou influenciada pelo que estou lendo, especialmente pela estrutura dos textos, escolhas de palavra etc.
Eu gostaria de cultivar mais alguns hábitos pra me manter criativa, como sair de casa, observar as pessoas nos lugares, tirar fotos, mas a pandemia acabou prejudicando bastante isso. Pretendo colocar essa ideia em prática assim que as coisas forem melhorando. Percebo que sair de casa, estar em movimento e fazer programas diferentes me trazem bem-estar e, logo, contribuem com a minha criatividade.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que, conforme fui escrevendo, fui entendendo melhor meu processo e meu estilo. Hoje me sinto mais segura de criar e de entender que tipo de história quero contar. É claro que a insegurança sempre bate a cada novo projeto, mas hoje sinto que consigo me entregar mais ao processo e de fato me divertir escrevendo.
E eu diria para meu eu começando a escrever que continue. O caminho não é fácil, mas está dando certo. E não se preocupar tanto com a proporção que as histórias ganhariam. Mesmo que nunca seja uma best-seller, valorizar cada leitor. E o principal de tudo: se conecte com pessoas que escrevem. Acho que teria começado a investir na literatura mais cedo se tivesse conhecido gente antes. Ter uma comunidade faz toda a diferença.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Eu queria, em algum momento, fazer algum projeto misturando música e literatura. Uma vez assisti a uma apresentação do escritor Marcelino Freire com a cantora Fabiana Cozza em que eles alternavam entre Marcelino lendo textos e Fabiana cantando. Eu achei aquilo incrível e pensei: adoraria fazer isso um dia. Eu sou bem tímida, mas acho que encararia esse desafio (desde que não precisasse cantar, pois sou péssima hahaha).
E o livro que eu gostaria de ler e não existe é sempre o que estou escrevendo no momento. Escrevo o que gosto de ler e acho que, mesmo que alguém tenha escrito algo com temática parecida (o que provavelmente vai acontecer), acredito que minha forma de contar é única. Eu sou minha primeira leitora e sou fã de tudo o que escrevo, mesmo reconhecendo que ainda tenho muito pra evoluir.
* Entrevista publicada em 10 de julho de 2022.