Caio Tozzi é escritor, roteirista e jornalista.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Pois é, quando se tem filho pequeno nem sempre é possível ter uma rotina certa – e eu tenho uma menina de seis anos. Mas, nos últimos tempos, tenho procurado acordar por volta das seis e meia e cumprir alguns rituais para começar meu dia, como fazer uma oração e também, ainda na parte da manhã, correr uma hora. Isso me deixa energizado para seguir em frente no meu dia.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sou do dia. Acho encantadora aquela imagem de quem é noturno, que começa a ter ideias quase de madrugada e fica ali escrevendo e criando noite a fora. Mas não consigo de jeito nenhum. Quanto mais cedo eu começar a criar, melhor. Fluo muito bem na parte da manhã e tenho percebido que, se começo a escrever bem cedo, por volta das oito, oito pouco, sigo criativo até umas duas e meia, três horas da tarde. Aí neste horário começo a travar, não consigo prosseguir – entendo que é o momento de deixar a criação para o dia seguinte.
Quanto ao ritual, não tenho nada específico não. Mas tenho que estar num lugar que me deixe calmo e protegido. Silêncio nem é preciso tanto, pois como disse, tenho uma criança em casa, e isso nem sempre é possível. Mas, por exemplo, não consigo sair na rua, ir num café (quando isso era permitido – voltaremos a este tempo em breve!) e escrever. As coisas me distraem, fico preocupado com o entorno. Preciso de um ambiente que me concentre.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Como sou roteirista e redator e ,pelo ofício, tenho que escrever praticamente todos os dias. Não é sempre a minha literatura, mas sempre tem um viés criativo. E hoje entendo que isso também é uma forma de se manter ativo. Quando decido fazer um projeto, depois de toda a organização das ideias, procuro sim estabelecer uma meta diária – podem ser páginas, pode ser um capítulo. Mas isso vai do que cada história pede.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu sou muito organizado, planejado. As ideias vem o tempo todo – mesmo quando quero um pouco de descanso para a cabeça elas surgem sem parar. Então, entendi que sou assim, ponto, vamos em frente. Gosto de escrever estas ideias em folhas de sulfite, sem pauta, sem estarem encadernadas. Comecei com este hábito não sei por qual motivo – fugi dos cadernos e blocos de anotação. Tenho impressão que os pensamentos ficam mais livres nos papéis em branco.
Vou anotando os pontos da história e organizando estas folhas em pastas dos respectivos projetos. Neste momento, vou descobrindo e afinando qual é a energia da história e faço as devidas pesquisas de gênero, de temas e assuntos que quero falar. Uma coisa que tenho feito e tem sido muito bom em alguns dos meus últimos projetos é conversar com pessoas, dialogar, trocar.
Aí, quando percebo que sei uma boa parte da história, que isso já está dentro de mim, vou para o computador organizá-las e começo a fazer uma escaleta. Sou totalmente da escaleta, preciso saber onde vou chegar, todos os pontos da trama que vou escrever. Este processo é mais demorado, mas também dá prazer. A escaleta vai ser minha base, meu chão. Escrevo e a reescrevo quase como se fosse uma primeira versão do livro. Quando sinto ela pronta, início de fato o trabalho da construção literária.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Sinceramente, não penso muito nisso. Não sou de procrastinar. Quando decido escrever uma história, vou analisando no processo inicial ou não se ela de fato vai ganhar corpo (às vezes percebermos que a ideia não vai ou que a escaleta que fizemos não funciona – já deixei escaletas inteiras prontas de lado). Mas se percebo que rola, faço. Sou muito focado. Acho que o processo de produção da escaleta me ajuda a seguir, não me deixa ansioso. Mas é um jeito meu, não está certo ou errado. Tem gente que senta no computador e vai escrevendo já o texto no formato literário conforme vem na cabeça. Essa ideia de escrever sem saber onde vou chegar é que me deixa aflito. Então encontrei meu método, que me permite levar tudo com mais fluidez.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Com a maturidade, a gente descobre que não precisa correr, né? No início, quando comecei a escrever queria que tudo ficasse pronto rápido e a revisão ficava completamente prejudicada. Hoje, além desse processo inicial da produção da escaleta, que mesmo ainda não sendo o texto literário já traz uma grande base para a história, reviso umas seis vezes o texto completo. Com a escaleta na mão, escrevo uma primeira versão do texto para coloca-la de pé. Sempre, na sequência, reescrevo uma segunda versão do zero – é reescrita completa, não revisão. Aí, começo os processos de leitura, que serão várias, para ajustar todos os pontos até que eu sinta que o livro está pronto.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Sou totalmente do computador. Faço as anotações iniciais do papel, no máximo estruturando as ideias. Mas na hora de escrever mesmo, da escaleta ao texto, é sempre no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Minhas ideias não param de brotar. A cabeça já está programada para pensar em histórias o tempo todo e isso até cansa. Às vezes quero dar um descanso e lá vem mais uma faísca criativa para algo novo. Isso é bom, mas é preciso estar atento, porque tenho muito temor em me repetir, fazer algo que já fiz. Então é este contínuo processo de ter a ideia e ficar avaliando se ela é forte e inédita o suficiente na minha trajetória para eu seguir em frente. E como estou sempre pensando em histórias, as fontes de inspiração são elas próprias. Então, sempre estou prestando atenção em livros, filmes, séries, enfim, tudo que está sendo criado mundo a fora.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Sempre fui muito organizado, mas como falei, acho que o grande avanço foi ser mais paciente. Saber e respeitar o tempo da criação, do crescer da história. Viver as etapas, sabe? O entender qual é a história. Escrevê-la. Reescrevê-la. Revisar. Revisar. Revisar. Acho que o que eu diria para mim mesmo lá atrás é: “menos ansiedade, cara! Vai tranquilo que dá certo. E revise, releia muito o que está escrevendo!”.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Minha paixão é a literatura para jovens leitoras. Meu trabalho tem sido focado nos livros infantojuvenis e juvenis. Dentro deste universo, ainda quero escrever um romance de formação, que acompanhe o amadurecimento dos personagens nesta transição da juventude para a vida adulta. Tenho este projeto guardado para fazer daqui a alguns anos.
Puxa, agora, qual livro eu gostaria de ler e não existe… hummm..difícil, hein? eu ainda preciso ler tantos que já existem!