Bruna Guerreiro é escritora e tradutora.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
O dia começa com meu filho me acordando em 9 de cada 10 manhãs. Ele é madrugador desde sempre. Infelizmente sou obrigada a admitir que depois disso vem o famigerado “tirar o celular do carregador e olhar as redes sociais”. Tudo errado, né? Em minha defesa só posso dizer que durmo com a internet do celular desligada, sempre, todas as noites, religiosamente (ou o equivalente a isto quando você pensar numa ateia). Depois disto é banheiro, cozinha, ajudar o marido a preparar o café e arrumar menino pra escola, algo que, na verdade, só voltou para nossa rotina em agosto, depois de mais de um ano no ensino remoto.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Quase sempre me sinto mais disposta a escrever de manhã ou no final da tarde, início da noite. Não tenho muito ritual de preparação, não, na maioria das vezes escrevo quando dá, quando o filho está ocupado a suficiente para não interromper demais. E quando está na escola.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Raramente trabalho com metas diárias, mas gosto de ter um ou dois dias da semana separados apenas para escrever. Durante o período do isolamento, na pandemia, foi impossível manter esse hábito, mas estou agora tentando retomar minhas terças e quintas exclusivas de escrita.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Eu geralmente começo pela escrita, ou melhor dizendo, por uma parte dela. Por aquilo que me moveu a escrever aquela história, geralmente uma cena, uma sequência, um capítulo que pode, ou não, ser o início do livro. Depois desse primeiro esboço é que passo para definir melhor personagens e linhas gerais do enredo, e é quando costumam surgir as questões que exigem pesquisa. Não costuma ser problemático pra mim me mover entre a pesquisa e a escrita, acabam acontecendo paralelamente, com turnos (ou dias) dedicados a uma e outra atividade.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Costumava lidar bastante bem com isso, aceitando as pausas, usando-as para reler e revisar e cortar. Do ano passado pra cá, tenho ficado mais impaciente, justamente por estar mais improdutiva. Nem sei se dá pra chamar de procrastinação pois na verdade eu não evito a escrita, eu sento pra escrever, eu releio, eu mexo nisso e naquilo, mas a concentração foi muito prejudicada pela pandemia, pelo isolamento com família e todo mundo em casa, pela quebra de rotina. Agora estou na luta para retomar o hábito, o ritmo de leitura, para sentir novamente a confiança de que sou capaz de concluir os projetos que inicio.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Depende muito do trabalho, mas nunca menos de duas revisões. Alguns trabalhos mais complexos eu revisei mais de 20 vezes – e não me arrependo, não acho “demais”, não para aquele livro. Sim, sempre peço a alguém que leia, e também depende do tipo de trabalho quantas pessoas vão ler e quem serão. Tenho um grupo de leitores beta e costuma ser alguém dali que vai ler o conto ou romance, mas não necessariamente todo mundo. Depende também das disponibilidades.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Escrever mesmo pra valer, cenas e capítulos, sempre no computador. Eu detesto “passar a limpo”, digitar o que está manuscrito. Mas para pensar, esquematizar, planejar o livro, fazer listas de cenas, desenrolar questões, fazer pesquisa, para tudo isso eu uso cadernos, muitos cadernos!
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
Não tenho muita dúvida de que o que mais faço para me manter ligada nesse fluxo é ler. Não consigo me imaginar sendo escritora sem ler muito. Ouvir música também é muito potente pra mim. Mas creio que uma das minhas fontes principais de inspiração são as pessoas que conheço e suas histórias. Gosto de prestar atenção, ouvir e imaginar.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Não mudei muita coisa, não, acho que fui aprimorando, compreendendo melhor a forma como eu funcionava na escrita e respeitando meus hábitos. Eu diria que tivesse confiança de que eu era, sim, capaz de terminar, de escrever finais, e que às vezes minha salvação seria justamente escrever o final primeiro, e depois o caminho até lá. Isso me adiantaria muito tempo e economizaria estresse de alguns trabalhos.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Acho que não tem um que ainda não comecei. Geralmente, quando tenho uma ideia, eu já logo começo. Mas tenho um romance político que tenho muita vontade de voltar a ele e terminar, tem sido bem difícil das últimas vezes que tentei. Esse é um livro que eu gostaria muito de ler e cabe a mim terminá-lo!