Anna Carolina Ribeiro é poeta, escritora e professora de Yoga.

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Eu acordo e vou trabalhar. Depois cuido da casa, almoço, assisto um episódio de alguma série e só aí vou escrever. Como trabalho de manhã e à noite como professora de Yoga, e reservo algumas horas certas do dia pra escrever prosa durante a tarde.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Costumo escrever bem no fim da manhã, à tarde e à noite – desde que eu não tenha feito muita coisa durante o dia. Geralmente só me coloco em frente ao computador e ouço música enquanto escrevo prosa. Já a poesia vem de forma mais espontânea, então eu normalmente sinto vontade de trabalhar algum som ou ideia que passaram por mim, e paro pra anotar. Às vezes a poesia já sai de uma vez. Às vezes preciso editar o que foi rascunhado também. E em outros momentos eu só anoto a ideia, as palavras ou o som que me chamaram a atenção e retorno depois pra dar sentido àquilo.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
Todos os dias me sento pra escrever por pelo menos uma hora. Em alguns dias, consigo escrever por mais do que esse tempo, caso eu tenha horários disponíveis pra isso. Sempre escrevo em blocos de uma ou meia hora. Levanto, vou fazer alguma outra coisa rápida e volto pra mais meia ou uma hora. Essa pausa é importante pra uma primeira decantação das ideias. Não tenho meta de escrita, só me reservo aquela hora e deixo vir o que vier. Às vezes sai um texto completo ou uma parte grande de algo maior, às vezes só vem um parágrafo. E isso também é parte do processo: sou constante, mas dentro da constância tem espaço pra variações.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
O que eu escrevo em ficção parte de uma ideia e de personagens. Os personagens geralmente são arquétipos que vão ganhando vida e história próprios conforme vou pensando neles. A ideia é um problema que surge pra que eles resolvam juntos e a história vai surgindo de acordo com o que cada um desses arquétipos faria diante da tal questão e da dinâmica que vai se mostrando entre eles pra lidar com o problema. Geralmente, as ideias são do meu próprio universo, então não me demanda muita pesquisa prévia, e vou fazendo pesquisas pontuais à medida que for surgindo a necessidade. Costumo conferir fatos e informações através de pesquisas depois de já ter escrito tudo, porque é aí que vou conferindo se as coisas têm sentido, se estão coerentes e coesas.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Estou sempre me dividindo pra falar sobre poesia e prosa, porque realmente elas funcionam de forma diferente pra mim. Não costumo ter bloqueios pra escrever prosa. O que me propõem para escrever, escrevo. O que eu me proponho pra escrever, escrevo. Se vai ser bom, eu descubro no fim. E sempre dá pra reler, revisar, alterar algumas coisas. Já a poesia vem a mim muito naturalmente a partir da observação da vida. Ela não tem bloqueios, mas existem sim períodos em que ela não vem.
Não tenho problemas com procrastinação. Sou naturalmente muito disciplinada. Se determino que vou escrever de 14:00 as 15:00 simplesmente escrevo. Fica a cargo da Anna Carolina do futuro melhorar o texto depois, se ele vier de uma maneira que não funcione como esperado. O medo de não corresponder às expectativas costuma surgir antes da publicação, quando o texto já está pronto. Aí eu publico as coisas mesmo com o medo, sabendo que ele tem um papel e um porquê de estar ali – as cobranças da sociedade, ou algum desejo de me aperfeiçoar em algo – mas, no fim das contas, naquele ponto o livro ou o texto já estão prontos e só falta um passinho. Como não gosto de desistir depois que já andei muito, mesmo que já não esteja tão animada, então vou e publico. O último passo na jornada de escrita é sempre o mais difícil pra mim, até porque dou muita energia pros projetos quando ainda estão começando. Então, nas estórias mais longas, acontece a mesma coisa. Eu escrevo muito, e só então, no fim, vem a crise. Mas como eu já fiz muito pra chegar até ali, não desisto e concluo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
O número de revisões depende do texto. Alguns continuam na cabeça, pedindo pra serem alterados. Se não tiver prazo, sempre dá pra mudar algo em um texto, e isso pode acabar aumentando o número de releituras, revisões, edições. Mas normalmente – até pra evitar remoer tanto um texto que nunca vai ficar perfeito mesmo, porque nada é – escrevo tudo, reviso e altero, releio, e peço pra alguém ler antes de mim – o que também depende do texto: alguns eu não mostro pra ninguém, outros pra um ou dois leitores beta, outros precisam ser de fato revisados de forma mais crítica e alguns eu peço pra muitas pessoas lerem. Aí, então, publico. Isso nos textos publicados na internet. O processo pra publicar Lua em Escorpião foi surpreendentemente bem mais longo. Os mesmos passos descritos anteriormente acabaram se repetindo em muitas etapas do processo de publicação.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
A poesia surge em qualquer superfície em que ela possa ser registrada: papel, computador, celular. Já a prosa é toda no computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativa?
As ideias vêm da vida, da observação, de conhecimentos que vou arranjando. Gosto de ler, ouvir música, ver filmes e séries e sair pra ver a natureza, pra pensar em nada. A inspiração vem dos mais variados lugares, mas a criatividade só acontece se houver ferramentas pra criar. E a vida é não só matéria-prima e inspiração, mas também ferramenta pra engenhar meus textos.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesma se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Hoje eu entendo a importância de concluir os textos primeiro, sem a preocupação que sejam perfeitos. Antigamente, eu deixava de terminar vários escritos porque não achavam que estavam bons durante o processo. É claro que não estavam, eram só a primeira versão. Costumam melhorar depois, mas a gente só descobre isso quando de fato termina algo e entende que os processos de revisão e edição também são partes da escrita. Mas sei que só sou assim porque a Anna Carolina do passado traçou essa trajetória de experiências – algumas que funcionaram melhor que outras – na busca da escrita perfeita. Então não diria a ela pra continuar fazendo o que queria fazer mesmo, porque só assim ela vai descobrir que perfeição não existe e que não é só porque uma coisa não é perfeita que ela perde o direito de existir.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Tenho alguns projetos de romance na gaveta. O que quero trabalhar primeiro é um romance sáfico leve, mas sem deixar de passar por questões importantes, com aqueles clichês que a gente sempre vê em filmes, mas que não encontramos em muita quantidade com representatividade LGBT+. Queria ler livros assim, como esse que penso em escrever.