Anderson Estevan é jornalista e escritor, autor de “Oito Contos Enjaulados” (Confraria do Vento, 2021).

Como você começa o seu dia? Você tem uma rotina matinal?
Costumo acordar bem cedo, e minha prioridade é o desjejum. Entende-se: café preto e uma maçã. Me atualizo das notícias e faço os meus planos para o dia. A partir daí começo a pensar na subjetividade das coisas. Trabalho em horário integral, e o tempo para a escrita é sempre entre uma coisa e outra, nas brechas. Acabo me equilibrando nesse ritmo, na falta completa de uma rotina criativa.
Em que hora do dia você sente que trabalha melhor? Você tem algum ritual de preparação para a escrita?
Sempre achei a manhã o melhor horário para escrever. Eu realmente acredito nessa coisa de começar o dia com ideias frescas e que a mente vai se contaminando conforme as horas passam. Mas é difícil manter esse ritual, diria que impossível, levando a minha rotina.
Você escreve um pouco todos os dias ou em períodos concentrados? Você tem uma meta de escrita diária?
A escrita sempre surge nos vãos, entre as tarefas e afazeres do mundo objetivo. Por algum tempo até tentei estipular metas, mas não consigo me manter por muitas horas ocupado apenas com a escrita. Hoje, a minha meta é uma frase que faça sentido.
Como é o seu processo de escrita? Uma vez que você compilou notas suficientes, é difícil começar? Como você se move da pesquisa para a escrita?
Tenho um arquivo on-line com o sugestivo nome de “ideias”. É neste lugar que vou colocando todas as pirações, trechos de diálogos e estruturas. Tudo muito sucinto e pontual, apenas para não deixar a ideia voar. Algumas coisas enfraquecem depois de ir para o papel, enquanto outras vão inchando, frutificando com o passar dos dias. Quando já consigo ver a história pronta, ou ao menos uma versão dela, vou escrevendo, escrevendo, até me esgotar. Aí recorro aos métodos e estruturas para me ajudar a tornar aquele esboço uma história. O resto é invenção.
Como você lida com as travas da escrita, como a procrastinação, o medo de não corresponder às expectativas e a ansiedade de trabalhar em projetos longos?
Ainda não aprendi a lidar com esse mundaréu de sentimentos desenfreados. Tento escrever o mais rápido possível para que possa me distanciar do texto, entre uma versão e outra. Nem sempre funciona. E não penso que vá mudar num horizonte próximo.
Quantas vezes você revisa seus textos antes de sentir que eles estão prontos? Você mostra seus trabalhos para outras pessoas antes de publicá-los?
Muitas vezes. Acho que esse é um sintoma da insegurança e isso é natural para a maioria dos escritores. Esse processo de martelar sobre algo que já existe é o que vai definir o potencial do que foi escrito.
Como é sua relação com a tecnologia? Você escreve seus primeiros rascunhos à mão ou no computador?
Como escrevo bastante em trânsito, a dobradinha celular e computador tem sido um ótimo método para fechar as primeiras versões dos textos e não perder ideias. Depois que as versões preliminares já estão prontas e preciso de mais cuidado na escrita, sigo apenas com o computador.
De onde vêm suas ideias? Há um conjunto de hábitos que você cultiva para se manter criativo?
Acho que cada escritor busca resolver um problema escrevendo. Pode ser um trauma, uma desilusão, ou mesmo alguma obsessão insólita. Eu me vejo na última categoria. Penso que existe uma entrelinha, um vão em que as coisas acontecem sob outros signos. São as nossas pirações, as coisas que não contamos a ninguém, mas que estão lá e sabemos disso. É esse pedaço escondido do mundo, onde reinam as pequenas verdades, que quero navegar.
O que você acha que mudou no seu processo de escrita ao longo dos anos? O que você diria a si mesmo se pudesse voltar à escrita de seus primeiros textos?
Acho que a possibilidade de conseguir me distanciar do texto e entendê-lo sem apego. Cortar, mudar rumos e contornar outras coisas que acontecem de maneira diferente do que pensei lá no começo. Escrever sempre será algo intuitivo, inconsciente, mesmo com todas as estratégias e esquemas postos e revistos. Em algumas vezes, o personagem segue por rumos diferentes do que imaginamos, rompendo a estrutura. Outras vezes, é justamente o contrário, o descontrole acaba por ruir a história. Então, eu diria que esse olhar menos apaixonado pelo texto é fundamental para entender que nem tudo precisa estar perfeito o tempo todo.
Que projeto você gostaria de fazer, mas ainda não começou? Que livro você gostaria de ler e ele ainda não existe?
Um grande romance, quem sabe?