Adriano Lobão Aragão é escritor, autor de Destinerário (poesia), Os tempos e a forma (poesia) e Os intrépidos andarilhos e outras margens (romance).

Como você organiza sua semana de trabalho? Você prefere ter vários projetos acontecendo ao mesmo tempo?
Todas as minhas atividades estão relacionadas primeiramente ao cumprimento das minhas obrigações profissionais como professor. Então, costumo me dedicar aos meus projetos de criação artístico-literária nas horas de folga, sobretudo à noite e feriados. Nesse sentido, não tenho uma rotina muito fechada, depende da demanda existente a cada semana, às vezes com várias coisas acontecendo ao mesmo tempo, às vezes com poucas atividades. Mas sempre estou trabalhando em pelo menos um projeto, toda semana.
Ao dar início a um novo projeto, você planeja tudo antes ou apenas deixa fluir? Qual o mais difícil, escrever a primeira ou a última frase?
Pra mim, isso é sempre relativo. Às vezes planejo tudo passo a passo, às vezes apenas deixo fluir, e às vezes um meio termo. Mas só costumo me preocupar com isso em casos bem específicos que exijam prazos ou que envolvam outras pessoas. No mais, vou fazendo aos poucos, de acordo com o tempo disponível. E acho a primeira frase a mais difícil. Concluir sempre me pareceu uma consequência do que fiz antes, ao longo do trabalho com o texto.
Você segue uma rotina quando está escrevendo um livro? Você precisa de silêncio e um ambiente em particular para escrever?
Muitas vezes, tento criar uma rotina, mas não me apego rigidamente a isso. Mas quando vejo que o livro está chegando perto de sua forma, digamos, definitiva, aí é quando costumo me dedicar mais continuadamente. No entanto, cada livro acaba me instigando a seguir um ritmo próprio. Não me apego muito a fórmulas, mas sim a experiências, testes, reformulações, a observar quais soluções linguísticas parecem mais adequadas a cada momento. Algumas vezes preciso de silêncio para produzir, outras vezes prefiro ouvir música enquanto escrevo. Mas o que realmente me incomoda é não me sentir à vontade num determinado ambiente. Nesses casos, não consigo produzir coisa alguma.
Você desenvolveu técnicas para lidar com a procrastinação? O que você faz quando se sente travado?
Acredito que dividir o trabalho em etapas, algumas delas sem estarem necessariamente numa ordem cronológica, seja interessante. Não estabeleço prazos para um trabalho como um todo, mas para partes desse trabalho que me possibilitem seu cumprimento em pouco tempo. Isso me traz a sensação de tarefa cumprida e me anima para prosseguir com mais tranquilidade. Em meio ao processo, anoto e guardo as ideias que vão surgindo e que podem ser utilizadas em outras etapas. E diante daqueles momentos em que todo o processo criativo parece parado, travado, gosto de anotar palavras aleatórias e imaginar o que fazer para colocá-las em um mesmo contexto. É meio lúdico, mas isso me ajuda bastante. Rsrs.
Qual dos seus textos deu mais trabalho para ser escrito? E qual você mais se orgulha de ter feito?
Logisticamente, o livro Destinerário, pois trata-se de um livro sobre cidades e cada poema foi escrito numa cidade diferente. O romance Os intrépidos andarilhos e outras margens também foi bastante trabalhoso. Reescrevi diversas vezes, num processo que levou alguns anos até chegar à forma em que foi publicado. Mas em nenhum desses casos posso dizer que foi algo exaustivo. Quando começava a se tornar estressante, eu dava um tempo e só retomava o trabalho algumas semanas depois. Eu não diria orgulho, mas senti uma certa satisfação pessoal ao ver esses dois trabalhos publicados.
Como você escolhe os temas para seus livros? Você mantém um leitor ideal em mente enquanto escreve?
Normalmente, vou anotando temas que surgem na mente e depois, revendo essas anotações, decido o que pretendo desenvolver, o que deixarei guardado para outro momento ou descartarei. Mas não utilizo nenhum procedimento específico para isso. É quase sempre intuitivo e espontâneo. No entanto, costumo fico atento a sugestões e acasos, nunca se sabe de onde uma boa ideia pode surgir. Não chego a me preocupar com um leitor ideal, mas quando se escreve, meio que intuitivamente algum suposto leitor imaginário sempre está presente.
Em que ponto você se sente à vontade para mostrar seus rascunhos para outras pessoas? Quem são as primeiras pessoas a ler seus manuscritos antes de eles seguirem para publicação?
Normalmente, não costumo mostrar rascunhos, ideias ainda não desenvolvidas. Mas quando começo efetivamente a me interessar por desenvolver algum rascunho, alguma ideia, então acho essencial dialogar com algumas pessoas, conversar sobre as possibilidades textuais. Acho muito importante ter alguns leitores prévios antes de decidir efetivamente publicar um texto. Minha leitora preferencial é minha amada, Assunção. As impressões dela sempre me ajudam a tomar decisões, tanto no sentido de retrabalhar como na maneira de publicar. Mesmo quando não concordamos, o ponto de vista dela sempre me ajudou a refletir melhor sobre meus trabalhos. Também gosto de apresentar meus projetos e inéditos para a Laís Romero e o Thiago E, desde 2002, quando o conheci, Wanderson Lima é meu interlocutor preferencial em todos os projetos literários que almejei construir. Tudo que publiquei de uns tempos pra cá passou pela leitura prévia de pelo menos duas das pessoas que mencionei.
Você lembra do momento em que decidiu se dedicar à escrita? O que você gostaria de ter ouvido quando começou e ninguém te contou?
Desde de criança, eu desejei produzir alguma coisa ligada à arte. Inicialmente, meu interesse era por escrever e desenhar histórias em quadrinhos. Passava horas e horas desenhando, e cheguei a fazer várias HQs, amadoramente, claro, tanto na infância quando na adolescência. Antes de me dedicar prioritariamente à poesia, escrevi um romance quando eu tinha 17 anos que permaneceu inédito, e assim permanecerá, mas que me serviu de importante exercício para decidir me dedicar à produção literária. Então, eu não teria um único momento em que decidi me dedicar à escrita. Na verdade, foram vários momentos, vários episódios que foram se sucedendo, com alguns abandonos e retomadas. Não sei se existe algo específico que eu deveria ter ouvido. Aconteceram muitos incentivos e inúmeros desestímulos e decepções também, mas eu apenas segui adiante fazendo o que achava interessante e buscando maneiras independentes de publicação. Nesse sentido, gostaria que naqueles primeiros passos, eu tivesse tido mais interlocutores sobre o fazer poético e as especificidades dos meios literários.
Que dificuldades você encontrou para desenvolver um estilo próprio? Algum autor influenciou você mais do que outros?
Acredito que, de maneira consciente ou inconsciente, tudo que produzimos está associado ao que já lemos, ao que já tivemos contato, ao que nos provocou alguma inquietação. E penso que isso não se aplica apenas a temas, mas à própria construção de estilo, e o que muitas vezes pode ser visto como uma dicção própria, talvez seja o resultado de toda uma vivência permeada por influências diretas e indiretas, intencionais ou não. A arte, assim como a comunicação em si, é um exercício permanente de interação, e o artista é influenciado não apenas por outros artistas, mas também pelo público, pela época, por todos os fatores que podem interferir em sua produção. Então, acredito que, se por acaso eu tiver algum estilo próprio, ele é resultado de tudo que li, ouvi, assisti, vivenciei e da maneira como li meus próprios textos. E de como fui lido também. Lembrando que até o que lemos e nos causa repulsa nos instiga a não seguir por um determinado caminho, nos instiga a combater ideias opressoras, posturas autoritárias, preconceitos etc. Dentre os autores que mais interferiram na minha forma de trabalhar o texto escrito, eu penso que H. Dobal e Jorge Luis Borges, dentre muitos outros, tiveram um papel essencial.
Que livro você mais tem recomendado para as outras pessoas?
No âmbito da poesia, gostei bastante da edição da Poesia Completa de João Cabral de Melo Neto, organizada recentemente pelo Antonio Carlos Secchim. E vale também indicar seu livro de ensaios João Cabral de Ponta a Ponta. Também costumo indicar o livro Escrever ficção, do Luiz Antonio de Assis Brasil. Trata-se de um livro muito interessante para quem busca iniciar ou aprimorar a escritas literária, sobretudo o romance.